Vi com muita preocupação a demonstração de intolerância e
xenofobia de alguns médicos brasileiros e também nas redes sociais diante da
chegada dos profissionais cubanos ao Brasil, para atuarem no Programa Mais
Médicos do Governo Federal. O gesto dos nossos ‘pobres de espírito’ é o retrato
de uma sociedade elitista, racista e intolerante, como se fossem meninos
ranzinzas que alguém tivesse lhes tirado um brinquedo.
A imagem daquele médico negro cubano sendo vaiado me deu
arrepios. Será que estamos vivendo um retrocesso social em que as pessoas estão
se voltando para o próprio umbigo e não se importam com o semelhante? Que
profissionais são esses que fazem um juramento no ato da formatura prometendo
salvar vidas e o que a gente percebe é uma parte que pensa apenas em ganhar
dinheiro?
Tenho muitos amigos de infância que são médicos e bons profissionais,
dedicados, preocupados em exercer a profissão que abarcaram com ética e
respeito ao próximo, mas esse tipo de gente que vi na cena da chegada dos cubanos é digna de
repúdio. Tenho escutado muitas reclamações de pacientes que vão a especialistas
e esses nem sequer os olham nos olhos, muito menos os examinam.
Digo isso porque já aconteceu comigo e fiquei indignada
diante de uma ginecologista que, numa primeira consulta, apenas escrevia no
papel, de cabeça baixa e quando terminou de me questionar disse que eu voltasse
quando os exames estivessem prontos: nunca mais eu voltei lá.
Os médicos que
vieram de Cuba não vão tirar o bolo de ninguém: apenas vão atuar em um programa
em locais onde nossos ilustres profissionais se negaram a ir, porque não eram
cidades balneárias onde pudessem se divertir entre uma folga e outra.
Dizer que o Brasil é uma democracia racial é uma piada,
apesar de nós sermos uma bela mistura de raças que vieram povoar o país. Que
nossos ilustres relembrem o que estudaram na escola, nos primeiros anos, que
somos descendentes de negros, índios e brancos. Uma mistura, um caldo de
cultura.
O Governo Federal implantou o Mais Médicos como uma resposta
‘ao acordar das ruas’, para dar uma satisfação à onda de protestos que
aconteceram no mês de junho, em várias partes do país. Há muitas críticas com
relação aos programas sociais do governo, mas a gente tem que ser crítico
consciente, vendo os erros e os acertos e observando onde se pode melhorar.
Estamos aqui para isso e não para demonstrar incivilidade e barbarismo.
O Brasil foi o último a se ver livre da escravidão. Vivemos 400
anos sob um regime tirânico, numa sociedade escravocrata onde os negros eram
vistos como burros de carga. “O preconceito e o racismo de alguns é porque
ainda eles têm saudade da casa grande e da senzala”, disse o secretário de
gestão estratégica e participativa do Ministério da Saúde, Odorico Monteiro, à
Folha de São Paulo e eu não tenho dúvidas.
E para quem já estava esquecido ou não sabe ainda, é bom
lembrar: apesar das críticas, a decisão
do Governo Federal de importar médicos estrangeiros, em especial de Cuba, não é
nova e já foi usada no Brasil por gestores do PSDB. Em 1999, quando Fernando
Henrique Cardoso (PSDB) era presidente da República, pelo menos quatro estados
trouxeram cubanos para trabalhar em unidades de saúde. Não teve vaia e nem
protesto naquela época: por que será?
O motivo alegado pelo então governo foi o mesmo da
presidente Dilma Rousseff (PT), de que os locais não funcionavam por falta de
profissionais. Agora, ilustres parlamentares de oposição ao governo do PT
classificaram o programa ‘ Mais Médicos’ como irresponsável e eleitoreiro. E
ainda rotularam a medida da presidente Dilma como “indigna, indecorosa e
irresponsável”. Vá entender esse povo. Paz e bem nessa terra de Zumbi, Dandara
e Abdias Nascimento e de tantos líderes negros que lutaram para nos ver livre
de preconceito. Bom dia e fiquem com Deus.
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