Mirabel Alves Rocha
Advogado militante, integrante do Cedeca Zumbi dos Palmares, cursando especialização em Direitos Humanos
Desde que o Brasil se tornou signatário da doutrina da proteção integral, foi firmado um compromisso em favor da vida e da efetivação dos direitos de crianças e adolescentes. Em 1988, quando da promulgação da Constituição Federal, foi firmado esse mesmo compromisso no âmbito constitucional.
O Artigo 227 diz: “É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
Note que o direito à vida, como sempre ocorre nos dispositivos que tratam dos direitos fundamentais da pessoa humana, está elencado em primeiro lugar.
Em seguida, no ano de 1990, foi aprovada a lei considerada como sendo a de melhor conteúdo do ponto de vista dos direitos de criança e adolescentes na América Latina que é o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA (Lei 8.069/90). Tão defendida por uns, tão atacada por outros.
Mas, quem verdadeiramente tem razão? Os que atacam o ECA ou os que o defendem? Como defensor intransigente desta lei, quero me pronunciar, após o quê fique o leitor à vontade para fazer sua escolha a favor ou contra o ECA.
A mídia, em geral, tem estimulado as pessoas a desenvolverem um espírito de vingança e de revanche, ao invés de estimular que a sociedade exija as medidas que ataquem pela raiz o problema da criança e do adolescente que, por lógica e natural responsabilização é da sociedade e da família, em especial.
O que se vê é um grande número de crianças e adolescentes jogados à própria sorte em razão de inúmeros fatores, os quais são facilmente elencados: a ausência de políticas públicas suficientes nas áreas da educação, da saúde, da assistência social, entre outros aspectos.
Tem sido comum vermos nos sinais de trânsito das grandes cidades meninos e meninas limpando para-brisa de carros em troca de moedas, o que as deixa fragilizadas e expostas a uma série de riscos, alguns tão graves que podem gerar consequências para o resto de suas vidas. Muitos desses meninos e meninas sustentam a família com o que conseguem mendigando e limpando para-brisas nos sinais e o mais grave é que cenas como essas não causa indignação em quase mais nenhuma pessoa.
Quando a sociedade falha na inclusão da criança e do adolescente, inevitavelmente vai amargar a criminalidade quando o futuro chegar; essa, infelizmente, tem sido a regra. Podendo essa situação se agravar ainda mais com o crescimento do exército de crianças desamparadas que em um amanhã não muito longínquo serão jovens e adultos carregando todas as sequelas da exclusão que foram vítimas na infância. Ou seja, o Brasil é um país reprovado no quesito criança e adolescente. Muita promessa e pouco compromisso.
Enquanto as nossas crianças, as que estão nos lixões e nas periferias à margem das políticas públicas inclusivas, estão sendo excluídas para depois serem assassinadas, os gestores estão dormindo por entenderem que o que oferecem é suficiente para resolver o problema.
Infelizmente, o exercício do cargo público no Brasil não é encarado como um serviço e sim como uma conquista pessoal que, não raro, entorpece a visão do agente público sobre o seu real problema na democracia representativa.
É mais fácil para os gestores de plantão eliminarem o problema de forma repressora ao invés de investirem na educação pública de qualidade e em outras políticas. Não sendo impossível tal realidade, já que o contribuinte brasileiro tem uma carga de impostos igual ou maior que as democracias europeias, amarga um serviço público de péssima qualidade.
Os que atacam o ECA estão prestando um enorme serviços aos políticos corruptos que desviam até o dinheiro da merenda escolar, vez que é mais cômodo criminalizar um ser em desenvolvimento do qual foram negados os direitos fundamentais, para que ele se desenvolvesse de maneira cidadã. Diferente do que dizem os contrários ao estatuto, o ECA é uma lei de enorme conteúdo cidadão, haja vista garantir o direito do cidadão brasileiro desde que ele se encontra no ventre materno até a chegada da sua maioridade, o que ocorre aos 18 anos de idade.
Um Brasil melhor é possível, desde que o povo brasileiro se proponha a conhecer os seus direitos e não fique somente no ter conhecimento, mas que exerça a cidadania, o que pressupõe o pleno acesso a todas as políticas ofertadas pelo Estado.
As nossas crianças e adolescentes, independentemente de sua cor, religião e, principalmente de sua condição social, merecem melhores governantes, mais sensíveis e preocupados com o futuro de cada menino e menina brasileiro(a), preocupados de fato e ao ponto de não tolerar nenhuma criança fora da escola ou sem que haja o exercício da primazia no acesso aos serviços de saúde, assistência social e outros.
O legislador, motivado pelo povo brasileiro, fez a sua parte quando votou e aprovou o ECA, falta, contudo, conhecermos melhor essa que é uma das nossas melhores leis, por seu conteúdo cidadão. Por tudo isso eu digo: O ESTATUTO ESTÁ AÍ, SÓ FALTA CUMPRIR.
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