Olívia de Cássia - Jornalista
Minha mãe se preocupava com a quantidade de piolhos que eu
adquiria na escola, pois, da mesma forma que meu cabelo era muito grande,
abaixo da cintura, ficava difícil dizimar aquelas criaturas. Eu morria de
vergonha quando sentava em algum lugar que caía um piolho. Mamãe colocava
Baygon, álcool e amarrava minha cabeça com um pano branco, para matar os
miseráveis.
Depois fazia uma verdadeira sessão de catação, com o pente
fino, para tirar aquelas criaturas nojentas, que estavam mortas. Eu não
entendia o motivo de eu pegar tanto piolho, já que tomava tanto banho e mamãe
tinha tanto cuidado com a nossa higiene, mas com tanto aglomerado e sentando
com outros coleguinhas nas bancas escolares ficava fácil a transmissão.
Nas passeatas comemorativas à Emancipação Política de União
dos Palmares, fui escalada para sair de baliza, por quatro vezes, representando
a escola, o que me rendeu de Antônio Matias a alcunha de “Baliza”. E toda vez
que eu passava em frente a casa dele, ele gritava: “Baliza!”. Eu não acredito
que eu tivesse desenvoltura, nem beleza, como eu via nas minhas amigas, além de
ser muito pequena, para sair de pelotão em frente das bandas de fanfarra. Eu
era muito sem jeito e dava meus tropeços, mas dona Lalinha ia lá em casa pedir
a mamãe e ela deixava eu desfilar, ainda agora não entendo o motivo.
Além dessas participações em frente às bandas de fanfarra
das escolas, fui porta-aliança de quatro
casamentos na cidade: o de meu tio Antônio com tia Hermínia (eu e a prima
Rita), o de dona Carminha Leão e Anselmo, o Nininho (novamente a mesma
dupla), o de tia Renalva com Zequinha
(idem), além de ter sido, também, dama
de outra moça da rua do Jatobá, que já não lembro mais quem foi.
Eu era muito desajeitada, desastrada e quando estava
aprendendo a andar de bicicleta, caía muito. Quando Rosemary Veras ganhou sua
primeira Monark eu pedi emprestado para dar uma voltinha. Era nova em folha,
vermelha, e fui andar na rua do “Cangote”.
Mas para desviar de uma carroça, fiz uma manobra tão maluca que levei
uma bruta queda, me arranhei toda, amassei e empenei o novo brinquedo de Mary.
Coitada da minha amiga, não sei
qual foi a desculpa que deu
quando chegou em casa com sua
bicicleta toda destroçada, mas eu fiquei
envergonhada.
Minhas traquinagens de criança arteira chegavam ao fim
quando mamãe descobria que eu estava tomando banho no Rio Mundaú, quase ao meio
dia, com minhas amigas de infância, Maria José e Marisa, irmãs de Quitério
Matias. Levava umas boas sovas com o cinturão de meu pai, que mamãe guardava
atrás da porta do quarto. E assim eu ia
desobedecendo às ordens da minha mãe, ao contrário do meu querido irmão
Petrônio, que era sempre muito obediente e terminou sendo chamado por nós, os
outros filhos, de o “queridinho da mamãe”.
Nas festas de Santa Maria Madalena papai, que era devoto
fervoroso da santa, nos levava ou ia às nove noites para o evento. Era quando a
gente cometia os excessos: da gula, com os tira-gostos que mamãe fazia, e
tomávamos bastante refrigerantes, além de comer pipoca, amendoim e tudo o que
pudéssemos consumir, além das voltinhas na roda-gigante, corridas nos barcos,
que faziam parte das nossas pequenas realizações infantis.
Nossa casa ficava cheia de visitas, dos parentes e dos
amigos dos meus pais. Eu ficava contente porque sabia que mamãe não ia me
bater, caso cometesse algum deslize, e que ela ia preparar comidas diferentes.
Eu sempre fui muito comilona. Mamãe nunca teve problema com a minha alimentação,
porque sempre comi de tudo. Mas quando eu adoecia, não queria comer nada e ela me
adulava, oferecendo as comidas que eu mais gostava. Se eu ficasse sem comer,
era porque não estava bem, era o primeiro sinal de que estava doente.
Meu padrinho Durval Vieira ia me buscar, todos os domingos,
na Rua da Ponte, para passear de jipe. Íamos para a fazenda Sete Léguas, de
propriedade dele, onde comíamos muitas frutas e tomávamos banho no açude. Na
Semana Santa, meu padrinho mandava represar o açude que transbordava de tão
cheio, para que fosse feita a pescaria. Entrávamos ali, eu e Luciana Medeiros,
sobrinha de madrinha Nenzinha, esposa de padrinho Durval, junto com os
empregados do sítio, para observarmos os peixes que eram pescados. Eu adorava
aqueles passeios com o meu padrinho, que só me trazia para casa na hora do
almoço. Tinha muita afeição por ele e por minha madrinha Nenzinha que ainda
vive em União.
Minha avó e meu pai queriam que eu seguisse a carreira
religiosa e me tornasse feira. Eu dizia para minha avó que nunca iria me casar
e que adotaria uma criança, quando ficasse mais velha. Eu sempre repetia isso:
que não queria ter filhos porque tinha medo de parir. Dizia também que não
queria casar porque, logo cedo, desenvolvi uma aversão pela instituição oficial
do casamento, como se eu já estivesse prevendo o que iria me acontecer no
futuro.
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