Foto: Sandro Lima
Olívia de Cássia
Repórter
Ter alguém desaparecido na família causa uma dor que não tem
dimensão: é difícil explicar, como dizem as mães, e muito mais quando se trata
de crianças e adolescentes. Segundo estimativas do Governo Federal, 40 mil
menores de idade desaparecem todo ano no país, isso em dados oficiais: o número
pode ser muito maior porque não há registros de todos os casos, por falta de
informação da população.
Em Alagoas, o Sistema de Informação da Polícia Civil, a
pedido da reportagem da Tribuna Independente, fez um levantamento das crianças
e adolescentes que estão desaparecidos em todo o Estado e o resultado
surpreende: este ano, até o dia quatro de setembro, estavam sumidas de casa 21
crianças e 88 adolescentes.
Em Maceió, a realidade, segundo o delegado Medson Maia, da Gerência
de Estatística e Análise Criminal, é a seguinte: também até o dia quatro de
setembro, 14 crianças e 53 adolescentes estavam desaparecidos. Os nomes e as
fotos dos menores, porém, não podem ser divulgados porque não há autorização
por escrito das famílias, segundo justifica a Polícia Civil.
Todos os meses, novos casos são registrados pela Polícia
Civil, a exemplo do desaparecimento do menino Davi Martins, 12 anos, que sofre
de esquizofrenia. Ele já fugiu de casa mais de vinte vezes e, novamente, na semana
passada.
A mãe dele, a cabeleireira Patrícia Martins, vive um drama
peculiar. A cada vez que o filho some, no conjunto Freitas Neto, no Benedito
Bentes, em Maceió, além de prestar queixa na Delegacia dos Crimes contra
Criança e Adolescente, ela faz uma peregrinação pela cidade em busca da
criança.
Patrícia conta que os medicamentos usados para tratar Davi
não têm surtido o efeito esperado e, sem controle do comportamento do garoto,
ela já chegou a acorrentá-lo em casa. Davi continua sendo procurado pela
família e pela polícia.
Famílias vivem drama à espera
de um desfecho
Dona Maria Cícera da Silva, mãe adotiva de Adeilton José da
Silva, 13 anos, residente na Rua Evilásio Torres, em Viçosa, deixou a
estatística alagoana de pessoas com parentes desaparecidos após vivenciar dois
dias de angústia. Adeilton sumiu no dia 12 de agosto e foi encontrado por
moradores do município no dia 14. Foi a segunda fuga do menino, segundo dona
Maria Cícera, que se diz aliviada e, ao mesmo tempo, preocupada com o
comportamento de Adeilton.
Ela conta que o adolescente fugiu porque não quer mais ir
para escola. “O diretor da escola deu uns conselhos para Adeilton e ele não
quis ouvir”. Segundo dona Maria Cícera, o garoto foi encontrado escondido num
beco de uma casa vizinha à escola, foi levado para a delegacia regional,
acompanhado do Conselho Tutelar e disse lá que não quer mais estudar.
Para tentar driblar a situação, a família vai tentar
encaixá-lo em outra escola de Viçosa. O Conselho Tutelar do município e uma
psicóloga da instituição vão fazer o acompanhamento de Adeilton nos próximos
meses. “Os meninos de hoje não são como os de antigamente; só querem luxar, são
desobedientes. A gente faz de tudo por eles. Ele tem um pai alcoólatra que vive
caído pelas ruas. Já peguei vários sobrinhos e outras crianças para criar e
eles não me deram tanto trabalho quanto ele”, diz.
TRISTE FIM
Dona Maria de Fátima Mota, avó do menino Felipe Vicente da
Silva, dois anos, não teve a mesma sorte de dona Cícera e sabe bem o que é o
desaparecimento de uma criança na família: dias de angústia e muito sofrimento.
Felipe Vicente desapareceu da casa de dona Fátima, no Conjunto Cleto Marques
Luz, no bairro do Tabuleiro do Martins quando ficou sozinho na calçada por
alguns minutos. Ele foi encontrado morto no dia 29 de junho, 13 dias após ter
sido sequestrado. A polícia diz ter suspeitos, mas até agora não houve prisão.
Conflitos familiares incentivam fugas
Foto:Sandro Lima (arquivo)
Delegada Bárbara Arraes, da DCCA |
Fuga por conflitos familiares, sequestros para exploração
sexual ou para tráfico internacional de pessoas e órgãos, saída de casa para
ficar com o namorado são alguns dos motivos apontados pelas autoridades para
tantos desaparecimentos de crianças e adolescentes todos os anos em Alagoas.
Em Maceió, a delegada Bárbara Arraes, titular da Delegacia
dos Crimes contra Criança e Adolescente observa que a maioria dos
desaparecimentos na capital alagoana é por fuga de casa. A orientação que é
dada para as famílias é fazer a comunicação do fato à polícia o mais rápido
possível. “Antigamente tinha que esperar um prazo de 24 horas para comunicar o
desaparecimento; hoje não existe qualquer prazo, até porque a busca deve ser
imediata, de acordo com a lei”, observa.
Bárbara Arraes ressalta que o quanto antes a notícia do
desaparecimento for comunicada, mais chances há de a polícia localizar a
criança. Aliado a isso, ela observa que é feito um Boletim de Ocorrência na
delegacia e a impressão de cartazes com as fotos das crianças procuradas, para
serem exibidas por meio de parceria com a Superintendência Municipal de
Transporte e Trânsito (SMTT) nos ônibus da capital.
“A gente pede que a família entregue a foto para fazer os
cartazes e que procure os meios de comunicação, para divulgar o
desaparecimento, mas nem todo mundo quer expor as fotos dos filhos na mídia.
Também orientamos que levem as fotos para a televisão para que mais pessoas
fiquem sabendo, pois a ajuda dos meios de comunicação é fundamental”, destaca.
Pais desatentos facilitam sumiços
A questão da droga também é um dos motivos das fugas de
adolescentes, segundo a delegada Bárbara Arraes, titular da Delegacia dos
Crimes contra Criança e Adolescente. E por conta disso ela aconselha que os
pais acompanhem a rotina dos filhos. “Também existe muito hoje adolescentes que
estão começando a vida sexual cedo e saem de casa para ficar com seus
namorados. Antigamente existia esse tipo de crime era rapto”.
“É importante que a família comunique o mais rápido
possível, mas infelizmente tem família que, quando vem procurar a criança, já
passou muito tempo e aí fica difícil. Nós recomendamos aos pais e familiares
que conheçam os hábitos dos seus filhos, que observem em que site eles estão
entrando, com quem estão se relacionando ou saindo, para evitar a questão dos
entorpecentes, e ainda, quem são os amigos, se estão frequentando as aulas,
entre outras orientações”, pontua.
A delegada explica que tem casos de crianças que dizem em
casa que vão para a escola e ‘matam’ a aula para fazer outras atividades. “Vou
contar um caso recente de uma menina que a família pensava que estivesse
frequentando as aulas e ela fazia mais de um mês que tinha sido suspensa na
escola e não contou aos pais. Ela desapareceu e quando a família foi na escola
descobriu que ela tinha sido suspensa. Depois foi encontrada”, conta.
As famílias de crianças desaparecidas em Maceió, segundo
Bárbara Arraes, são encaminhadas para o Centro de Referência Especializado de
Assistência Social (Creas), unidade pública e estatal, que oferta serviços
especializados e continuados a famílias e indivíduos em situação de ameaça ou
violação de direitos (violência física, psicológica, sexual, tráfico de
pessoas, cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto, entre outros
casos).
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