domingo, 7 de novembro de 2010

Somos todos loucos?


Olívia de Cássia – jornalista

Diz um dito popular que de médico, jornalista, poeta e louco todo mundo tem um pouco. Acho que tenho um pouco dessa loucura dos inquietos. Os questionamentos e interrogações ainda são muitos. Na adolescência esse sentimento de rebeldia era acentuado, hoje nem tanto assim.
A maturidade e a idade nos mostram outros caminhos, às vezes sim, às vezes não. Sempre questionei determinados padrões de opiniões, discordei de muitas, agi pela emoção, me ferrei porque usei mais o coração do que a razão, mas nunca fiz nada que me doesse a consciência.
Tem gente por aí que faz tudo de caso pensado, traça sua vida em cima de uma corrida à caça de dinheiro, poder e fama como se isso fosse a coisa mais importante da vida. Para atingir esses objetivos, essas pessoas passam por cima de qualquer sentimento e de qualquer pessoa, mesmo que tenham recebido amor e carinho, não têm escrúpulos e nem coração.
Quando eu cursava o quarto ou quinto período da faculdade, época em que frequentei alguns movimentos feministas em Maceió, se deu a necessidade de ler muitos livros sobre a questão do feminismo e as implicações na história da sociedade.
Nessa época estávamos começando a traçar o nosso TCC – Trabalho de Conclusão de Curso, cujo foco era a questão da mulher e sua evolução no mundo e o trabalho prático um programa de rádio sobre a questão feminina, que não chegou a se firmar na época do governo Sarney.
Nossa programação prática foi veiculada num serviço de alto-falante do tipo cornetas, que pertencia à Associação de Moradores do Tabuleiro do Martins, a Amotam. Fazíamos os programas aos sábados, na porta de um abatedouro de frangos, na Feirinha do Tabuleiro, com aquele cheiro de galinheiro e penas voando pra todo lado. Foi uma grande aventura que dela tirei muitos ensinamentos.
Tive que estudar muito, ler muitos livros, para a parte teórica do trabalho, mais de trinta para entender a questão do feminismo e do marxismo, temas que não me eram de todo estranho, pois sempre li e gostava de saber sobre a luta das mulheres em busca de seus caminhos na sociedade.
Li de tudo: De Mariazinha a Maria, de Marta Suplicy, à A Origem da Família da Propriedade Privada e do Estado, de Engels. Os estudos que Bachofren fez sobre as sociedades matriarcais, onde as mulheres eram o centro em torno do qual girava a vida familiar e outros textos de Lenin, Rose Marie Muraro, entre outros autores clássicos sobre o tema.
Todo esse estudo foi para entender que as mulheres vêm lutando por um lugar ao sol desde que o mundo é mundo, como dizia minha mãe. Dizem os grandes autores que o trabalho da mulher foi se tornando desvalorizado quando o homem precisou ir para a guerra e ela ficou em casa cuidando da agricultura, da caça, da casa e dos filhos e foi aí que seu trabalho começou a ser desvalorizado ao longo dos séculos.
Muito foi conseguido pelos movimentos sociais, evoluímos em muitas questões, conseguimos aprovar muitas leis que beneficiam a vida das mulheres, mas o preconceito de gênero, em sua essência, ainda é muito forte na sociedade moderna e a violência contra a mulher tem um índice crescente que assusta a cada dia.
O professor, jornalista e sociólogo Antonio Cerveira de Moura era nosso orientador de projeto e um feminista de plantão. Moura nos deu o caminho, dava dicas maravilhosas de leitura, nos indicava autores consagrados, teóricos marxistas e nos passava a sua experiência prática na profissão que iríamos abarcar.
Nunca mais eu soube notícias dele, que voltou para São Paulo e não deu mais informações para os ex-alunos de sua vida. Digam o que disserem dele, mas nos ensinou muito, foi um ótimo professor. O tempo de faculdade para mim foi um tempo de aprendizado. Naquela época tínhamos muita ânsia de saber e de chegar ao mercado de trabalho, de ter o reconhecimento e o respeito profissional.
Tínhamos muito sonhos, principalmente no meu caso, que em União dos Palmares fui a primeira mocinha, na minha época, a estudar Jornalismo numa faculdade. Isso não era corriqueiro como hoje e fui apontada como louca. Uma loucura que me faz pensar até hoje: somos todos loucos ou só eu que me perdi?

Um comentário:

Madalena Sofia Galvão Viana disse...

Minha cara Olívia, mais um texto muito bom de ler. Acredito que somos, no fundo, todos loucos. Em cada atitude acertada há uma pontinha de loucura. Abraços.

Aqui dentro tudo é igual

  Olívia de Cássia Cerqueira   Aqui dentro está tudo igual. Lá fora os bem-te-vis e outros pássaros que não sei identificar, fazem a fes...