Em Busca de uma Comunicação Alternativa da Mulher
Olívia de Cássia - jornalista
O nosso trabalho “Em Busca de uma Comunicação Alternativa da Mulher”, finalizado em 1988, teve como objetivo a realização de um programa de rádio para as mulheres e foi realizado na Feirinha do Tabuleiro, em Maceió, por absoluta falta de apoio das rádios que procuramos à época: Rádio Clube de Rio Largo e Maceió-FM, pertencentes ao mesmo grupo.
O Projeto Experimental, hoje denominado TCC, faz parte das disciplinas obrigatórias na conclusão do Curso de Comunicação Social, onde deveriam constar uma parte prática e outra teórica.
Durante um ano freqüentamos a comunidade do Tabuleiro do Martins, a fim de que pudéssemos concluir nosso objetivo – o programa de rádio, com a participação das mulheres que freqüentavam a feira -.
Nos reuníamos no correr da semana com as mulheres e a diretoria da Amotam – Associação dos Moradores do Tabuleiro, na Rua do Arame, e, no sábado, realizaríamos os programas.
Embora a presença de cerca de 50 mulheres nas reuniões, sabíamos que estavam ali apenas em busca do assistencialismo prometido com a ajuda da LBA – Legião Brasileira da Assistência, para a distribuição do tíquetes do leite do programa do Governo Sarney e enxovais prometidos às gestantes.
Os poucos programas que conseguimos realizar aconteceram na porta de um abatedor de frango, o Galeto da Quitéria, que nos cedia a energia para que pudéssemos instalar as cornetas (sistema de auto-falante), o amplificador e os dois gravadores que usávamos.
Nossa programação acontecia durante 15 minutos e era feita dentro de um outro programa de rádio, das colegas, também concluintes do Curso de Comunicação Social, Eunides Lins e Carla Salignac, que nos concedia o horário. Dessa forma, às vezes, dada a extensão do programa delas, o nosso ficava prejudicado.
Mesmo que não tenhamos alcançado o êxito desejado - as mulheres inteiradas à nossa proposta - , conseguimos àquela época despertar a atenção de alguns ouvintes, que todos os sábados nos esperavam na porta do Galeto da Quitéria.
E quando falávamos sobre violência , a questão da saúde e as agressões e discriminação sofrida pela mulher, principalmente se ela for pobre e negra, sentíamos receptividade por parte dos ouvintes, que participavam concedendo depoimentos de suas vivências diárias na comunidade.
Conseguimos fazer quatro programas, levando a médica responsável pelo posto do Tabuleiro, que discorreu sobre o aborto, violência e o Sistema Único e Descentralizado de Saúde, implantado à época pelo governo Sarney.
Embora a presença das autoridades em saúde tenha deixado acanhadas aquelas pessoas, conseguimos, também, depoimentos dos homens que falaram principalmente sobre a violência contra suas filhas e mulheres.
Outros problemas foram abordados como: carestia, custo de vida, Comissão de Sistematização da Constituinte (quando explicávamos o que era), o Centrão (explicávamos também o que era e para que e quem servia), as propostas levadas pelas mulheres para serem aprovadas na Constituinte e tantos outros assuntos que julgávamos importantes para a comunidade.
O resultado obtido não chegou ao que desejávamos, pois contaram ali a nossa inexperiência, as condições em que eram realizados os programas, sem nenhuma estrutura, o desinteresse de alguns membros da Associação pelo tema Mulher e também a falta de consciência da discriminação, da própria mulher do Tabuleiro.
Como exemplo tivemos o da vice-presidenta da associação, à época, que deu seu depoimento num dos nossos programas dizendo que apanhou do marido, mas que “se é ruim com ele, pior sem ele”, mostrando o quadro de submissão em que vive a mulher, principalmente nas camadas mais pobres da sociedade.
Mas a nossa realização pessoal se completou, quando, apesar das exigências burocráticas impostas à época pelo sistema universitário, tivemos que aprender, na marra, tudo o que não tínhamos visto durante os quatro anos e meio do curso.
Por conta da boa orientação que recebemos do professor e sociólogo Antònio Cerveira de Moura, formos obrigadas a ler, pesquisar, estudar e buscar um acervo de dados, que nos foi bastante enriquecedor. Tivemos que ler e reler, fazendo resumos e fichamentos junto às entrevistas, cerca de 60 volumes entre livros, revistas e jornais, que complementaram o trabalho.
Dentro desse contexto teórico abordado, destacamos os seguintes aspectos: a exploração do sistema capitalista contra a mulher, abordagens teóricas sobre a origem da opressão da mulher, o contexto da mulher no Tabuleiro, capítulo sobre o movimento de mulher alagoano, onde inserimos uma aparte sobre as quilombolas – mulheres do quilombo - que tiveram como líder a mãe de Ganga Zumba, Aqualtune, líder das mulheres negras na época dos quilombos.
Esse capítulo foi publicado na Revista Presença da Mulher, ano V, nº 19 0 Abril/Junho de 1991, cuja manchete principal foi Mulher Poder e Trabalho. Embora tenha sido publicado com defasagem de dados, pois o trabalho foi concluído e apresentado em 1988, coisa que a revista não destacou, sentimos-nos muito recompensadas pelo reconhecimento do nosso projeto, em âmbito nacional.
Foram entrevistadas em agosto de 1988, todas as lideranças das entidades de mulheres de Maceió e no final do trabalho tivemos que dispor dos scripts, relatórios e entrevistas para a conclusão e análise global do trabalho. Nossa equipe foi formada de três componentes: eu, Niviane Rodrigues e Maria Rosiane Rocha.
O projeto Experimental foi um trabalho que nos deu muita satisfação em ser produzido, pois o tema mulher é fascinante e ainda tem muito o que ser discutido e aprofundado, apesar dos avanços conseguidos com a promulgação da Constituição de 1988.
Feito a três mãos, e cada uma tendo que dispor de uma tarefa, o segundo passo que precisávamos dar era tentar publicá-lo, com algumas referências atualizadas, para que não ficasse engavetado e fosse distribuído nas escolas e colégios, bem como em bibliotecas públicas. Essa foi a nossa proposta inicial, quando tivemos a idéia de executá-lo, mas nunca conseguimos publicar.
De lá para cá não mudou muito a situação da mulher da periferia de Maceió. Todos os dias os noticiários indicam que a violência contra a mulher tem aumentado, mesmo depois da promulgação da Lei Maria da Penha pelo presidente Lula. A lei está ameaçada de não ser colocada em prática porque segundo que foi divulgado na imprensa, alguns juízes se recusam a aplicá-la em alguns itens.
Nesse 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, vamos fazer uma reflexão sobre nosso papel na sociedade e analisar de que forma estamos contribuindo para diminuir as desigualdades sociais e para difundir a paz em nossa comunidade. (Olívia de Cássia Correia de Cerqueira – jornalista)
domingo, 7 de março de 2010
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