Olívia de Cássia – jornalista
A gente já sabe o que vai ouvir do médico, tem a certeza e
consciência do problema, mas quando escuta a informação, dá uma tristeza danada,
pode acreditar, não é autopiedade, não. Fui atendida no começo da tarde por uma
neurologista e ela, além de lembrar e destacar todos os inconvenientes da
ataxia, me confirmou que ainda não tem remédio, depois de eu fazer um relato do
que é conviver com o problema e dizer que tenho pesquisado sobre a doença.
Em 2005 eu escrevi meu primeiro sobre a ataxia e o que é
conviver com ela. O texto foi uma solicitação de Priscila Fonseca, presidente da Associação Brasileira dos
Portadores das Ataxias Hereditárias e Adquiridas, para fazer parte de um livro
sobre os portadores do problema e seus familiares.
Naquela época, meu problema ainda não tinha se agravado e os
sintomas eram leves: foi logo após eu ter uma crise emocional, provocada pela
minha separação, que me levou à depressão. Muita gente na minha idade,
inclusive vários parentes meus, já não consegue se locomover sem a ajuda de um
andador ou de uma cadeira de rodas, devido aos tombos e quedas que são
frequentes.
Ultimamente já sinto os sintomas se agravarem, mas não faço
mais disso um cavalo de batalha. Logo que me certifiquei ser portadora de DMJ
(Doença de Machado Joseph) eu fiquei entristecida, embora já desconfiasse por
ter acompanhado meu pai e meu irmão e muitos dos meus parentes.
Não sou hipócrita ao ponto de dizer que esse problema não me
afeta, porque não estaria sendo verdadeira, pois as limitações que se
apresentam em meu corpo já não me permitem alguns movimentos mais ousados. Mas
hoje em dia encaro a vida de forma diferente e sigo aquela máxima de tentar
aproveitar, na medida do possível, ainda, o que eu puder, pois não sei por
quanto tempo ainda vou poder fazê-lo.
Se esse momento fosse
em outras épocas eu estaria agora em prantos, desdizendo do mundo e da minha
sorte, mas tenho que agradecer a Deus por ainda poder caminhar, embora que de
forma cambaleante e poder ver o sol. Tenho tido a sorte de também a minha fala ainda
não ter sido comprometida; mas as quedas e os tombos aumentaram, assim como os
engasgos e outros problemas.
Para muita gente, a ataxia (DMJ) é ainda um mistério. No nosso
núcleo familiar todos só a conheciam como “a doença da família” ou a “maldição da família Siqueira/Cerqueira\Correia”
e há bem pouco tempo é que descobrimos o nome científico. É uma doença rara e
segundo os cientistas teve início na Ilha dos Açores, em Portugal; na nossa
família os casamentos consanguíneos se deram de forma desordenada e isso
contribui com a descendência.
Na internet é fácil a gente encontrar links e comunidades de
piadas que foram criados por atáxicos com a finalidade de tornar o nosso
dia-a-dia mais digerível, ameno e menos pesado e é isso que tenho tentado
fazer. A internet nos trouxe muitas
facilidades porque podemos trocar informações com outros portadores da doença
em comunidades como o Facebook, grupos como o Ataxia net no Yahoo e
outros.
Quem convive diariamente com um portador de ataxia, no
estágio mais avançado, sabe do que eu estou falando. Há muito preconceito ainda
na sociedade para com as pessoas que têm esse problema, tanto que muita gente
esconde a doença e diz que é apenas uma labirintite.
Não preciso de teste genético, molecular, para saber que eu fui uma ‘escolhida’. Convivi com meu pai, acompanhei tudo de perto e tenho consciência dos meus sintomas e limitações, mas não é nada fácil conviver com isso.
Não preciso de teste genético, molecular, para saber que eu fui uma ‘escolhida’. Convivi com meu pai, acompanhei tudo de perto e tenho consciência dos meus sintomas e limitações, mas não é nada fácil conviver com isso.
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