sexta-feira, 22 de outubro de 2010
O “Caboquinho” e o Passarinho
Olívia de Cássia – jornalista
Minha tia Josefa Paes de Siqueira era a filha mais velha dos oito filhos que meus avós Manoel e Olívia tiveram. Minha mãe contava que essa minha tia que não cheguei a conhecer, casou-se muito cedo com José Antônio da Silva e tiveram três filhos: Julião, Olival e Edleuza. Josefa faleceu muito cedo deixando os três filhos muito pequenos e cada uma das irmãs ficou com um dos filhos para tomar conta, mesmo ainda sendo crianças também.
Tia Ozória assumiu os cuidados com Julião, o mais velho; Olival ficou com minha mãe e Edleuza com minha tia Noêmia. A vida na roça era muito difícil naquela época e mesmo meu avô Manoel Paes de Siqueira sendo proprietário de terras e senhor de engenho, minha mãe e minhas tias tinham que trabalhar muito capinando mato ou plantando para terem alguma coisa.
Minha mãe contava que quando tia Noêmia casou foi embora para o Rio de Janeiro e numa das visitas que fez à irmã, viajando de navio até a cidade maravilhosa, levou meu primo Olival e conseguiu um internato para ele numa instituição de menores denominada de O Pequeno Jornaleiro. Esses meus primos passaram muitas dificuldades na vida e minha família foi marcada por vários acontecimentos tristes, alguns permeados de tragédias ou de fatos inusitados.
Olival e Julião ficaram adultos e montaram oficina mecânica e conseguiram se estabelecer durante alguns anos no Rio de Janeiro; de vez em quando visitavam minha família, quando ainda morávamos na Rua da Ponte, em União dos Palmares. Quando chegavam lá de carro, aquilo para nossa vida de criança era um fato extraordinário, uma festa.
Me afeiçoei a esses primos que só vim conhecer já adultos. Depois de muitos anos já estabelecidos e bem de vida no Rio de Janeiro, por conta de um atropelamento que aconteceu com Olival, quando estava dirigindo um dos carros, eles resolveram voltar para Alagoas e montar oficina em Maceió para ficar mais perto dos irmãos, pois depois que minha tia Josefa faleceu, tio José Antônio casou com outra Josefa, prima da mulher falecida.
Em nossa família os casamentos entre primos eram comuns e os médicos avaliam que por conta desses relacionamentos dos nossos antepassados entre primos de sangue é que a ataxia se desenvolveu com tanta frequência, tendo já atingido, segundo o que andei pesquisando, mais de oitenta pessoas. A outra tia Josefa (que na verdade é nossa prima legítima) teve seis filhos com tio José Antônio, nada mais justo do que Olival e Julião quererem ficar mais perto da família. Vieram e montaram oficina na Vieira Perdigão, onde anos depois muitos membros da nossa família se instalaram na capital alagoana.
Minha prima Edileuza casou com um meio irmão do meu pai, tio Pisciliano e com ele teve cinco filhos; esse meu tio era problemático e bebia muito, dava muito trabalho e a família vivia em dificuldade. Meu pai tentou ajudar o irmão problemático de alguma forma, mas não conseguiu e anos depois ele resolveu ir tentar a vida no Rio de Janeiro, mas lá ele morreu atropelado por um ônibus.
Devido a esse casamento da nossa prima com um tio, passamos a chamá-la de tia também e isso era uma confusão danada na nossa cabeça de criança. Não entendíamos aquele relacionamento de uma prima que se tornou nossa tia depois.
Depois de viúva tia Edleuza casou novamente; dessa vez foi feliz no segundo casamento, teve mais um filho, tornou a ficar viúva com o filho caçula ainda criança, mas tocou a sua vida, mesmo com sacrifício e muita luta e ainda hoje mora no subúrbio do Rio de Janeiro.
Instalados em Maceió, Julião e Olival montaram sociedade com um dos irmãos da madrasta Josefa e tocaram a oficina, mas o índice de alcoolismo nessa profissão naquela época era mais acentuado. Julião contraiu uma doença renal e precisou passar várias vezes por hemodiálise até que faleceu, na Santa Casa.
Olival se tornou um nômade, andarilho, não se firmou na profissão que aprendeu e o vício o levou a falir a oficina. Fazia muitas amizades, era uma pessoa muito querida de todos, apesar dos problemas que às vezes criava. Ele gostava de ler muito e de trocar informações comigo sobre os livros que lia, mas quando estava bêbado mal dizia alguns familiares dos quais tinha alguma queixa, recitava os versos de Augusto dos Anjos e levou sua vida assim, sem compromisso com nada, nem com ninguém.
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