segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Dos brinquedos de criança

Olívia de Cássia – jornalista

Eu tinha poucas bonecas e elas eram baratinhas, porque minha mãe não costumava comprar brinquedos caros para a gente, mas a boneca que eu mais gostava na minha infância era a Karina, que foi um presente da minha tia Ester, meia irmã do meu pai. Só perdi a Karina porque numa das visitas que recebemos de São Paulo, eu já adolescente, um dos meus irmãos jogou a boneca no carro dos paulistas na hora em que iam embora e não pude fazer nada; fiquei injuriada em ter perdido minha boneca preferida.
Além da Karina eu tinha a Rute, que era de um plástico bem molinho, com um coque na cabeça e ganhou esse nome por conta da primeira versão da novela Mulheres de Areia que tinha duas irmãs gêmeas: Rute e Raquel, sendo que a Rute era do bem. Mas eu possuía também a Wanderleia, a Vanusa e outras de pano e baratas, da feira livre, que eu dava nome de artistas da época, coisa que faço agora com meus gatos e cachorros; sempre coloco nomes de celebridades que eu admiro, escritores, poetas, cantores, atores; os meus ídolos.
Hoje em dia as meninas entram no mundo adulto muito cedo e deixam as bonecas para namorar sério e até engravidam ainda crianças. Eu era muito ingênua e até os 17 anos brincava de boneca e só me desfiz dos brinquedos que ganhava do meu avô e de mamãe quando comecei a namorar mais sério, depois da primeira paixão, com vergonha de que o namorado pudesse me achar muito infantil.
Eu e Yelma Cardoso passeávamos com as nossas ‘filhas’ na garupa da bicicleta, na calçada grande, em frente à Praça Antenor de Mendonça Uchoa, a pracinha do Cine Imperatriz, em União dos Palmares. Minha amiga tinha as bonecas Suzy, que era a moda da época, como a Barby de hoje em dia. Eu não tive bonecas da moda e nem possuí bicicleta quando criança ou adolescente; tinha uma vontade danada, mas costumava pegar carona nos brinquedos das amigas mais aquinhoadas do que eu e Yelma e Yenya Cardoso eram essas amigas.
Uma vez eu tomei emprestada para dar uma voltinha a bicicleta vermelha Monark nova de Rosimary Veras, mas como sou desastrada, me desequilibrei lá na Rua do Cangote, levei uma queda, me machuquei toda e o brinquedo da minha amiga ficou todo torto. Não sei o que ela disse para seu Maurino e dona Rosinha quando chegou em casa, e também não lembro qual a desculpa que lhe dei ou o que fiz para diminuir a vergonha e a culpa. Até hoje eu falo desse mico para minhas amigas.
Nós brincávamos também de cozinhar, lá no quintal de doutor Nilson Mendonça. Mas da mesma forma que eu nunca fiz nada que prestasse na cozinha, quando criança isso era muito pior e as amigas Nelminha e Roseane faziam a culinária, que comíamos com muito gosto. Nas brincadeiras de boneca e de casinha eu era sempre uma filha ou mãe sozinha que cuidava das crianças, representadas nas minhas fantasias pelas bonecas, cujo companheiro tinha morrido ou vivia viajando a negócios.
Eu arrumava os brinquedos que o meu avô Manoel e minha mãe me presenteavam, embaixo da mesa da sala e ficava no local por horas a fio, no meu mundo de fantasias, conversando e interpretando aquela encenação com as bonecas, que naquela época eram as minhas confidentes.
O tempo passou, a pureza da infância foi se perdendo pelo tempo e a maturidade exige da gente atitudes, coerência, responsabilidades e outros itens do mundo adulto. Quando a gente cresce vai seguindo a vida cada um pro seu lado, tomando rumos diferentes, mas as lembranças da infância permanecem. Com essas lembranças a gente procura fazer um link e entender o que somos hoje.

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