Conte-me sua vida: Olívia de Cássia
A jornalista Olívia de Cássia Correia de Cerqueira nasceu no dia 9 de janeiro de 1960, na cidade de União dos Palmares.
"Nasci na minha querida Rua da Ponte, em casa, naquela casinha que ficava entre o Bar da Nivalda e a mercearia que foi do meu pai, quase em frente ao posto de gasolina de seu Nininho." (Olívia de Cássia)
Entrevista
BLOG: Qual a maior lembrança que você tem da sua infância ou adolescência em União dos Palmares?
OC: Da minha infância, minha maior lembrança afetiva é na Rua da Ponte, hoje destruída pela última enchente do dia 18 de junho, fato que me doeu muito quando vi tudo aquilo acabado.
Foi na Rua da Ponte que meus pais iniciaram a vida, quando vieram da roça recém-casados e ali constituíram um patrimônio, tirando assim o nosso sustento. Em primeiro lugar com um pequeno hotel, que depois veio a falir, depois com a mercearia e o armazém de compra e venda de cereais, além das casinhas de aluguel que possuíram ali, no começo da rua.
Outra forte lembrança que eu tenho é a do meu avô Manoel Correia Paes e da Minha avó Olívia, os pais da minha mãe. Convivi muito de perto com eles, éramos muito ligados. Quando foram para outro plano eu estava com 15 anos, sofri muito.
Também as brincadeiras da infância, os banhos no Rio Mundaú. Além dos meus avós, também meu tio Antônio Paes de Siqueira completa minhas lembranças da infância, meus passeios e férias na Barriguda, tudo era muito encantador para nós. Tivemos uma infância muito sadia, de muitas aventuras e brincadeiras e de muitos amigos.
Já da adolescência, as escadarias do Rocha Cavalcante, o Cine Imperatriz, a Praça Antenor de Mendonça Uchoa e a Avenida Monsenhor Clóvis eram os nossos points de encontro. Fiz muitas amizades em União dos Palmares, muitas das quais já se perderam pelo tempo, seja com a partida prematura de alguns amigos, como o meu querido Alonsinho, ou pela roda-viva da vida que separa quase todo mundo.
Nossa turma da adolescência era composta de rapazes e moças de todas as idades e classes sociais, não tínhamos distinção naquela época e os relacionamentos eram mais fraternos e duradouros, tanto as amizades quanto os namoros.
BLOG: Como surgiu a idéia de criar um blog?
OC: A idéia do blog surgiu justamente por eu gostar de escrever sobre assuntos diversos. Desde as minhas poesias, que eu sentia vontade de publicar e não tinha como, até os artigos e dramas pessoais e meu livro de memórias, que publiquei em um deles em pequenos capítulos.
Com essa nova ferramenta nas mãos, resolvi criar o primeiro e assim fui indo, publicando textos, fotos. Já estou no quarto blog, porque os espaços dos outros expiraram, por conta do excesso de fotos que eu postava. Agora estou colocando mais textos e poucas fotos, que eu reservo para o Orkut e que muita gente reclama pelo excesso.
BLOG: Sente falta de morar em União dos Palmares?
OC: Sinto muita falta de União dos Palmares, até andei sondando os preços de imóveis, pequenos apartamentos, na esperança de alugar algum, mas a especulação imobiliária na cidade está excessiva e fora das minhas posses, mas não desisti ainda. Penso, em quando me aposentar, ter meu cantinho na terrinha, mas vai ter que ser um lugar onde eu possa criar meus bichinhos de estimação.
Quase toda semana eu viajo a União, seja para alguma atividade política, seja para ficar de bobeira ou rever amigos e familiares. Amo minha terra natal e sinto falta dos bons momentos que aí vivi. Às vezes eu fico analisando e avaliando se essa saudade que sinto, às vezes exagerada, não é de uma União diferente, onde muitos amigos da adolescência já não estão mais nesse plano e a conjuntura da cidade era bem diferente do atual contexto que estamos vivendo.
BLOG: Como é a vida de jornalista?
OC: A vida de jornalista é uma correria sem fim, mas eu não saberia mais viver de outra forma. Trabalho os três horários e venho em casa apenas para o almoço e o banho e volto, quase sempre, todos os dias, depois das onze.
Ser jornalista foi a profissão que escolhi por amor, sonhava em cobrir guerras, feito Euclides da Cunha em seu romance 'Os Sertões'. Sempre fui muito sonhadora.
Sobreviver de jornalismo é um perrengue danado em Alagoas e eu tenho consciência de que deveria, em paralelo, ter seguido outra carreira que me proporcionasse mais conforto e mais bem-estar. Mas eu devo admitir também que eu sou muito desorganizada.
Não dou muito valor a dinheiro, se eu ganhasse o que me bastasse para minhas despesas, já seria o suficiente para o meu pequeno conforto, não sei administrá-lo e ele foge das minhas mãos quando eu menos espero. Nesse ponto eu não puxei a minha mãe, que era muito organizada e muito segura. Eu sou muito ‘mão aberta’ e gasto com muita facilidade. Tenho consciência de que preciso me disciplinar nesse sentido.
BLOG: O sonho de seus pais era de que fosse médica, eles se chocaram quando decidiu estudar jornalismo?
OC: Quando eu era criança, meu pai queria que eu seguisse a carreira religiosa, que fosse freira, e eu dizia a ele que nunca ia me casar. Minha mãe queria que eu fosse uma mulher independente, que não casasse, que fosse médica ou que seguisse outra profissão, menos jornalismo. Da mesma forma que eu sempre fui muito rebelde e contestadora, fui fazer jornalismo.
Sempre gostei de poesia, de leitura, de música de boa qualidade, de escrever e me identificava com a profissão de alguma forma. Minha mãe me criticava e dizia que jornalismo era profissão de doido e de maconheiro.
Quando eu passei no vestibular de Comunicação Social, habilitação em jornalismo, quando cheguei lá em casa, toda sorridente, ela me disse: 'O curso é tão ruim que foi o último que saiu na televisão'. Naquela época, a TV Alagoas divulgava ao vivo a relação dos aprovados, que era lida pelo professor Luiz Tojal. Fiquei triste com aquela reação dela e nunca esqueci aquela frase apoteótica da minha saudosa mãe.
Já meu pai não costumava interferir muito, mesmo que não gostasse da minha escolha, mas dizia que ser jornalista não ia me render o suficiente para eu me sustentar. Mas meu pai gostava muito de ler e eu levava jornais para ele, mesmo quando já estava bem acometido pela ataxia. Eu contava minhas histórias para ele. Éramos muito amigos e papai me confidenciava suas aventuras da juventude, sempre sorrindo. 'Era tudo brincadeira', dizia ele, quando mamãe estava perto e o assunto fosse de alguma namorada que ele teve.
BLOG: De quem foi a idéia do jornal "O Relâmpago"?
OC: A idéia foi da minha amiga Genisete Lucena, eu fazia a diagramação, escrevia alguns artigos e alguns textos e fotos. Genisete era a editorialista, editora e repórter também, tanto de texto quanto repórter fotográfica. Nádia Seabra ficava com a parte comercial.
Foram momentos muito bons aqueles de quando fazíamos o jornal, embora algumas autoridades do município não tenham entendido a proposta de uma imprensa comunitária fiscalizadora dos atos dos nossos governantes.
Era muito divertido fazer 'O Relâmpago', desde a confecção dos textos, à diagramação, levar pra gráfica e vendê-lo na feira de União. Era uma resenha dia de sábado.
Eu já contei em um dos meus textos, que de um lado da Rua Orlando Bugarim tínhamos leitores assíduos do boletim, mas do outro lado, ninguém comprava, era vendido a 50 centavos. Quem comprava a mim não comprava às meninas e vice-versa. Tínhamos leitores cativos. Foi uma aventura maravilhosa.
BLOG: O jornal bem que podia voltar a ser publicado, não é?
OC: Tenho saudade, mas não sei se hoje é mais possível, até por que o momento que estamos vivendo hoje é outro. Com a invenção da internet e a criação dos sites e blogs, perdeu um pouco o encanto. Mas quem sabe, não é? Nada é definitivo na vida e isso eu aprendi com a maturidade e as pancadas que levei na vida.
BLOG: Conte-nos um pouco sobre o livro "Mosaicos do Tempo”?
OC: Mosaicos do Tempo é meu livro de memórias. Uma proposta que eu sempre carreguei dentro de mim. Até porque quando era adolescente, como citei lá em cima, costumava escrever tudo o que acontecia comigo nos meus caderninhos. Desde os conflitos com minha saudosa mãe, até as decepções amorosas e as poesias.
BLOG: De onde surgiu a idéia do livro?
OC: Decidi escrevê-lo numa das minhas crises existenciais. Saí da terapia, que vinha fazendo tinha quatro meses, porque fiquei muito abalada depois da minha separação do meu casamento em união estável de quase vinte anos, e como não tinha mais condições financeiras de pagar à terapeuta, eu disse pra ela e tomei a decisão de fazer minha própria terapia colocando para fora todo aquele sentimento reprimido, todas as minhas histórias, desde a infância, até a separação.
Aí comecei a escrever e num dia só, quando terminei com o dia amanhecendo, eu tinha escrito dez laudas de papel A4. E comecei a resgatar a minha história de vida, desde a infância na Rua da Ponte e na Barriguda, os conflitos da adolescência, os amores, a morte dos meus pais e fui em frente. Quando terminei, eu tinha escrito 180 páginas em dois meses. Terminei em 2004, mas de lá para cá, sempre que retomo para fazer algum acréscimo ou alguma revisão, eu vou mudando um pouco o texto, cortando expressões mais carregadas que eu tenha colocado na hora da emoção.
BLOG: Quando será publicado?
OC: O livro está pronto, falta-me agora dinheiro para levar para a gráfica. Fiz vários orçamentos. No começo do ano fiquei muito esperançosa, vibrei com a possibilidade de conseguir patrocínio para a publicação.
Duas gráficas de São Paulo se mostraram interessadas, mas pelo contrato que mandaram para eu assinar, eu não teria direitos sobre a obra e fiquei receosa de perder os originais para a gráfica.
Tive algumas promessas de ajuda de alguns parlamentares estaduais. Falei com minha amiga Eliane Aquino e ela fez a apresentação, mas deu desânimo com a falta de interesse e eu não era louca de levar o original pra gráfica e depois não ter dinheiro para arcar com aquela despesa. Agora ele está de stand by, como a gente diz em jornalismo.
BLOG: O que fez você sair de sua terra natal?
OC: Saí de União dos Palmares para estudar o segundo grau. Naquela época só tinha o Pedagógico, que preparava os estudantes para ensinar crianças de primeira a quarta série. Vim para Maceió para fazer o curso médio, o Científico, como se chamava naquela época o Ensino Médio. Depois de reprovada no meu primeiro vestibular, que fiz para Medicina, voltei para União. Fiquei vindo todos os dias no ônibus dos estudantes para fazer o cursinho. Fui reprovada de novo.
Por incrível que pareça, fiz quatro vestibulares para poder, finalmente, realizar meu sonho de fazer jornalismo. Nesse intervalo voltei para União dos Palmares e fiquei durante mais cinco anos, tentando emprego e estudando. Aí mamãe conseguiu que eu ficasse como ouvinte, durante um certo período, no CETEPA, porque eu não queria ficar sem estudar.
Depois, por insistência dela, fiz o Pedagógico. Me formei em 1982 e finalmente no fim desse ano eu prestei vestibular para jornalismo e passei. Nessa época eu era funcionária da Usina Laginha, foi meu primeiro emprego no escritório do Almoxarifado da empresa.
Foi quando comecei a ganhar experiência em trabalhar, pois eu não sabia fazer nada. Meu pai só queria que a gente trabalhasse depois que terminasse os estudos. Mas aí, quando eu voltei de Maceió, quando tinha vindo fazer a inscrição do vestibular, fui demitida pela falta, ou coisa parecida. Foi a demissão mais bem-vinda que eu já recebi.
BLOG: Como está a sua vida atualmente?
OC: Minha vida atualmente é só trabalho mesmo. Passei cinco anos sozinha, depois da separação. Aí tive um namoro de um ano e meio, mas agora é uma grande amizade e vou seguindo em frente, em busca de dias melhores e mais justos, acompanhada dos meus bebês de quatro patas: meus gatos (tenho sete com os filhotinhos que a minha gata pariu e que estão prontos para doar) e meus cães que amo muito, a Malu e o Oto.
BLOG: O que você acha do blog "A Terra da Liberdade"?
OC: O Terra da Liberdade, sem querer desmerecer os demais blogs dos meus amigos palmarinos, é um dos melhores da terra. Essa proposta de resgatar a história de União e as pessoas que construíram esse enredo, é muito construtiva. Quando você falou naquela época que o blog poderia parar, eu fiquei triste. Felizmente você não foi em frente com a idéia de desativá-lo e hoje ele presta um grande serviço à população de União dos Palmares.
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