Por opção ou não, elas conseguem dar conta da vida e dos filhos, apesar da separação
Enfrentar a vida sendo mãe solteira não é tarefa das mais fáceis, ainda mais no Brasil onde a maioria da sociedade é conservadora e atrasada em algumas situações no que diz respeito à questão da mulher. São muitas as circunstâncias que as levam a enfrentar sozinhas a criação e educação de seus filhos.
No caso das mães solteiras, a dor de não poder compartilhar diariamente o cotidiano, as penas e as alegrias da paternidade, é igualmente intensa, porém logo se transforma em uma carga com a qual é preciso aprender a conviver, segundo os especialistas.
Renata Castro tem 25 anos, é nutricionista, mãe solteira por opção e engravidou aos 18, quando ainda estava cursando o ensino médio. “Engravidei aos 18 anos, ainda estava cursando o terceiro ano do ensino médio, mas não parei de estudar, pois tive apoio da minha mãe. Quinze dias depois que meu primeiro filho nasceu, comecei a faculdade e no meio do curso engravidei de novo, mas continuei estudando até a semana de ele nascer”, comenta.
A nutricionista destaca que depois de muitas lutas conseguiu terminar o curso, abrindo mão de noites de sono porque a única hora que tinha livre para estudar era nas madrugadas: “Minha mãe me ajudou muito e ainda ajuda, pois agora faço especialização em outro Estado e ela fica com os meus filhos para que eu possa estudar”, ressalta.
Ela conta que o pai dos meninos nunca foi muito presente: nem financeiramente nem na criação dos meninos. “Depois de muitas brigas ele vê os filhos a cada 15 dias e ajuda financeiramente (mesmo que não seja o suficiente)”, destaca.
Renata avalia que ser mãe solteira não é nada fácil, pois ainda existe muito preconceito na sociedade, “pois além de ser difícil educar os filhos, sozinha, ainda mais no mundo em que vivemos; mostrar a eles o caminho certo, longe de más companhias, drogas e outras situações negativas”, pontua.
A jovem mãe argumenta também que mesmo com todas as dificuldades, hoje está mais comum mulheres assumirem a maternidade sozinha, “pois vivemos em uma sociedade igualitária, homes e mulheres independentes. Hoje sou muito mais feliz depois da maternidade, tenho o tempo com meus filhos e tenho tempo para mim”, destaca.
Ela comenta que também tem tempo para socializar com os amigos e fazer novas amizades, mesmo sendo uma tarefa difícil: “Nem sempre posso fazer as coisas que quero, ou porque não tem quem fique com os meninos ou eles estão doentes, não faria nada de diferente”, explica.
Renata ressalta ainda que é mãe solteira por opção: “Sou mãe solteira por opção, porque não achava justo que meus filhos me vissem sofrendo por um relacionamento fracassado onde não existia respeito de uma das partes; meus filhos me tornaram uma pessoa melhor”, reforça.
Luciana Vieira conta que engravidou aos 17 anos do namorado e, da mesma forma que Fernando não aceitou a notícia quando teve a informação, a abandonou nos primeiros meses da gestação. “Eu não acreditei que aquela situação estivesse acontecendo comigo, porque durante o nosso namoro, ele se mostrava carinhoso, amoroso, avançado nas ideias e era muito companheiro”, destaca.
Depois da notícia da gravidez, ela explica que o namorado logo arrumou outra e deixou de falar com ela, como se ela tivesse cometido algum pecado grave ou tivesse erra feio com ele. “Não dava para acreditar que aquele cara que por quem eu tinha me apaixonado e estava morrendo de amor, tivesse errado tanto comigo; eu me perguntava o tempo todo onde eu tinha errado”, pontua.
Hoje em dia Luciana diz que não tem mais raiva de Fernando: “Cada um foi para o seu lado, tive que assumir a situação de mãe solteira sozinha, criar minha filha apenas com a ajuda da minha tia, pois sou órfã e não tinha mais meus pais para me ajudarem”, desabafa.
Ela explica que teve dificuldade para terminar de estudar, pois teve que conseguir um emprego por meio período, a tia ficava com a criança para que ela estudasse, mas ela disse que não foi muito longo e depois que terminou o ensino médio parou.
“Sinto falta de ter mais conhecimentos, mais estudos, mas por conta das dificuldades que a vida foi impondo, eu tive que abdicar dos meus sonhos”, ressalta.
Brasil tem mais de 20 milhões de mulheres que trabalham e cuidam dos filhos
O Brasil tem 67 milhões de mães; dessas, 31% são solteiras e 46% trabalham, segundo pesquisa do Instituto Data Popular. Jovens ou não, 55% das mães pertencem à classe média, 25% à classe alta e 20% são de classe baixa. De acordo com o estudo, as mães do século XXI são menos conservadoras.
Entre as mães do século passado, 75% acreditavam que uma pessoa só poderia ser feliz se constituísse família. Hoje esse papel já mudou, com a liberação da mulher e a vida moderna. A secretária da Mulher da Central Única dos Trabalhadores em Alagoas (CUT\AL), Girlene Lázaro, avalia que o número revelado na pesquisa é muito alto e que essa relação na sociedade precisa ser revista.
Segundo ela, é surpreendente esse número, “mas tendo em vista essa transformação que a sociedade vem passando, a gente imagina como isso vem acontecendo cada vez mais. Cotidianamente a gente vê jovens que durante um relacionamento engravidam; na gestação assumem ter o filho e os namorados se afastam, não assumem a criança e elas têm que fazê-lo sozinhas”, destaca.
Diante dessa possibilidade, a secretária da Mulher da CUT observa que essas mães entram no mercado de trabalho; assumem o filho, e os avós, que muitas vezes são idosos e não estão mais trabalhando, tomam conta das crianças.
“Isso vem aumentando, como diz a pesquisa; são mães que têm que estudar; trabalhar, ou às vezes abrir mão do estudo para poder trabalhar porque elas têm que assumir o filho que gerou e assumir sozinha, isso é uma dificuldade”, pontua.
Secretária da Mulher observa que quase sempre a mulher encara sozinha a maternidade
Girlene avalia que a sociedade precisa repensar essa questão e pergunta: “Por que é que sempre sobra para a mulher? Ou por que é sempre a mulher que encara sozinha a maternidade, quando os homens não assumem os filhos? Qual é o sentido de família ou de compromisso da relação entre um homem e uma mulher?”, questiona.
Militante do movimento feminista, a diretora sindical observa ainda que os homens têm que assumir as consequências de seus atos; sejam elas boas ou más. “As consequências sempre são colocadas para a mulher e essa relação passa por toda essa discussão de gênero, onde os homens ainda acham que cuidar da criança não é responsabilidade dos pais”, pontua.
A maioria dos homens, segundo Girlene Lázaro, não se sente responsável pela paternidade e fica uma carga muito pesada para a mulher, porque além de todas as questões que ainda permanecem na sociedade em relação à divisão sexual do trabalho, ela ainda tem que enfrentar a questão de gênero.
“Quando a mulher define que vai fazer um aborto, a sociedade condena; se ela faz, ela é marginalizada. Se assume a responsabilidade de engravidar, a carga é só dela, porque o pai não assume e ela é discriminada como mãe solteira. Ainda há esse preconceito na sociedade com a mãe solteira, é como se não visse isso com bons olhos e essa característica não fosse uma realidade”, avalia.
A líder sindical destaca ainda que esse comportamento social de discriminação com as mulheres que assumem os filhos sozinhas é como se estivéssemos no século passado e que é preciso compartilhar as responsabilidades.
“É preciso uma mudança de concepção na sociedade, uma transformação em relação a isso, onde haja uma divisão de responsabilidade e as pessoas entrassem numa relação sabendo as consequências e não só a mulher fosse culpada ou criminalizada por isso”, complementa.
Psicólogo destaca que responsabilidades têm que ser compartilhadas
O psicólogo Arnaldo Santtos observa que num casamento tradicional em que um pai e uma mãe vão cuidar de um bebê, as responsabilidades têm que ser compartilhadas, pois a vida do casal vai mudar completamente.
“São diversas as responsabilidades que serão assumidas para o resto da vida. Imagina se com toda essa responsabilidade, se a mãe tiver que cuidar do filho, sozinha? O fato de estar gestante já é por si só um fato ímpar na vida da mãe. É o que representa de mais sublime numa mulher: parir um filho, dar a luz. Esse poder, somente a mãe tem”, ressalta.
Segundo Arnaldo Santtos, mesmo no ventre da mãe, o feto, e posteriormente o bebê, já sente todo ambiente externo: “Seja ele positivo ou negativo, estressante ou não. Todas as emoções da mãe serão passadas para o bebê. Se a opção de ter o bebê sozinha for da mãe, mesmo assim, é preciso que se tenha plena consciência da situação, ou seja, de toda responsabilidade que se vai assumir”, explica.
O psicólogo destaca que o apoio da família é fundamental. “Ter um bebê “independente” é erro, até mesmo conceitual. O bebê não deve ser uma espécie de “objeto” da mãe: “eu produzi meu bebê.” Isso cria mecanismo de posse. E posse é um dos sinais de existência de algum tipo de patologia”, avalia.
Outro aspecto destacado pelo especialista é o ciúme possessivo. “Também é um sinal de que a pessoa precisa de psicoterapia. Apresentar comportamento de posse sobre o outro não é um comportamento saudável; aliás, o comportamento de amor é exatamente o inverso: é dar liberdade ao outro”, conceitua.
Em sua explanação, Arnaldo Santos destaca ainda que o papel de um pai na relação de criação do bebê é fundamental. “Na psicanálise ele representa a lei, o “não”, embora esse papel possa ser representado, também pela mãe, mesmo numa relação heterossexual”, pontua.
“Se a questão do criar o filho sozinho pela mãe foi porque o companheiro abandou o bebê, além da gestante, isso vai ter um efeito psicológico ainda muito mais negativo na mãe. Seria o sentimento de abandono duplo e neste caso é preciso que a mãe tenha um acompanhamento psicoterápico para suportar o sofrimento e também amenizá-lo”, finaliza.
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