terça-feira, 26 de agosto de 2014

Meus compadres e as boas lembranças ...

Olívia de Cássia – jornalista

Eles começaram a namorar nos anos de 1960, na Rua da Ponte, em União os Palmares. Ambos tinham muitos irmãos e irmãs. Ela era de família humilde, pai agricultor que com muito sacrifício veio para a cidade em busca de dias melhores. Essas eram as informações que eu tinha e guardo até hoje deles.

A família dele tinha mais posses: o pai era proprietário de terras no Muquém, povoado constituído de famílias em sua maioria quilombolas. Ele tinha  muitos irmãos, mas não tinha emprego definido.

Com o avançar do namoro ela engravidou e eles resolveram fugir de casa para morarem juntos, prática de muitos casais apaixonados de antigamente. Foram morar em uma casa alugada na Rua da Ponte, de propriedade dos meus pais.

Da mesma forma que ele não tinha emprego e nem profissão definida, passaram muitos apertos, mas o amor que sentiam um pelo outro era imenso e tiveram quatro filhos, dos quais eu e meus pais fomos padrinhos, mesmo eu sendo criança ainda e muito miúda.

Eu gostava de passar horas e horas na companhia daquela família que aprendi a admirar desde criança  e enquanto minha comadre ia para o Rio Mundaú  lavar pratos e roupas, eu ficava tomando conta das crianças e da casa e cuidava ‘bem’ de acordo com a minha idade de sete a oito anos.

Eu banhava os meninos, fazia o mingau, alimentava-os e os colocava para dormir, tudo isso ouvindo o velho rádio e as radionovelas que naquela época me empolgavam. Lili era minha comadre e confidente também, já naquela época. Eu contava para ela minhas pequenas histórias e éramos amigas.

Fiz muitas amizades na Rua da Ponte e todas as minhas memórias afetivas da infância, acho que ficaram por lá, agora só na imaginação, depois que nosso amado rio levou tudo na enchente de 2010.

Quando eu não estava na companhia dos moradores ouvindo e sendo testemunha de suas histórias de vida, me punha a subir nos pés de goiaba nos fundos do armazém do meu pai, tomava banho num pequeno tanque de águas represadas da chuva, ou no Mundaú, o que rendia boas surras da minha mãe e que depois me rendeu uma febre tifoide que quase me mata aos oito anos.

Rememorar a infância me traz doces recordações de um tempo que eu era feliz, vivia em liberdade e não tinha medo das ruas, que era onde eu passava a maior parte do meu tempo, onde aprendi  muitas lições numa escola em que hoje é impossível frequentar por conta da violência.

Lembranças que me acometem na manhã desta terça-feira, 26 de agosto, um mês que naquela época caia muita chuva em União e fazia com que a gente fosse tomar banho na rua, nas biqueiras das casas, sem se importar com nada.

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