terça-feira, 8 de junho de 2010

Minhas peripécias e artimanhas

Petrúcio Manoel Correia de Cerqueira - bancário

Financeiramente, tudo ia bem com os negócios do meu pai. Nos dois anos seguintes ao da enchente (1962 e 1963), pagou os débitos, e ainda conseguiu comprar uma pequena casa longe da beira do rio.
Eu, sinceramente, não achei boa essa mudança. Era na Rua da Ponte que eu me soltava, vivia livre como um passarinho. Pintava e bordava (como se dizia antigamente). Banhos de rio, saídas para passeios sem tempo predeterminados, visitas constantes à Serra da Barriga (onde eu conhecia quase todos os moradores, pois, eram quase todos clientes do meu pai).
Logo nos primeiros dias de morada nova, tudo que eu pensava, estava sendo concretizado. Meu pai proibiu qualquer um de nós de sair para a rua, e olhe, que nem carro naquela época existia por lá. Era a Rua Presciliano Sarmento, que terminava na entrada da Fazenda Terra Cavada, com um sítio de mangueiras que não tinha mais tamanho. Pra vocês terem uma idéia, hoje, onde era esse sítio, é a continuação da Rua até a Vila Kennedy, e a sede do sitio é onde está instalada a AABB.
Sim, como estava dizendo, a mudança não foi boa pra mim. Eu mesmo só saía de casa, pra levar o café ou o almoço pra meu pai na Rua da Ponte. Era uma tirada e tanto. Foi nessa rua que comecei também a me revoltar com a ordem de não sair, e com a revolta veio também as primeiras surras, e não foram poucas.
Se naquele tempo existisse, como hoje existe, negócio de Conselho Tutelar, era capaz de meu pai e minha mãe terem de explicar algumas vezes, tamanha eram as surras que eu levava. E tem um pequeno agravo nisso tudo, às vezes (isso era o que eu achava) era sem motivo declarado, mas nem por isso, virei marginal, nem tão pouco deixei de gostar do meu pai e de minha querida mãe.
Numa dessas, fui um dia de feira (sábado é dia de feira em União) levava café pra meu pai. Pra cortar caminho, fui por trás do Grupo Rocha Cavalcante. A Rua Costa Rêgo naquela época não era pavimentada e era apelidada de "Apertado da Hora". Levava uma garrafa térmica com café e marmita com cuscuz e carne.
Escorreguei na lama, e lá se foi o café do meu pai. Imaginei logo no que iria acontecer. Não voltei pra casa. Imaginei que seria pior, e continuei. Quando cheguei ao armazém, todo melado de lama, inventei logo uma mentira pra ver se me safava daquela. Um boi vindo da Terra Cavada, e solto, teria me feito aquela desgraça. Ufa, consegui me safar, mas, só Deus sabe como.
Outra feita (essa não teve jeito), inventei de ir com um amigo pra essa tal de Terra Cavada (que eu nem conhecia), pra caçar pássaros. Saímos pela manhã umas nove horas. Entretidos, nem prestamos atenção no passar do tempo. Quando demos por conta, já estava perto de escurecer. Foi aí que bateu a agonia em nós. Estávamos perdidos, sem rumo que tomar, e ainda por cima escurecendo.
Foi quando o protetor dos meninos nos mandou um homem que voltava da pescaria no Rio Mundaú. Quando chegamos na rua em que morávamos, imaginem só a confusão que estava. Aí eu pensei, é hoje.
Quando me aproximava de casa, todo cabisbaixo, minha tia Osória se encontrava na calçada e disse-me: “Hoje quem vai te bater sou eu, pois sua mãe está sem condições, e não quero que teu pai te bata; o porquê, você já sabe, não é”? Pense na surra.
A falta de condições que minha tia alegava, depois eu soube, foi que, com a preocupação que ela teve nesse dia, ela abortou por minha causa. Surra bem merecida essa. (* Meu irmão mais velho)

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