Avaliação é de Arísia Barros, professora, publicitária e coordenadora do Instituto Raízes de Áficas
Às vésperas do Mês da Consciência Negra, a reportagem foi conversar com Arísia Barros, publicitária, professora e coordenadora do Instituto Raízes de Áfricas, que nos falou sobre a importância do Dia 20 de Novembro para o povo negro, quando se homenageia em todo o país o herói Zumbi dos Palmares.
Segundo a professora, O Dia da Consciência Negra é uma ressignificação de todo o processo de luta do movimento e é a busca da possibilidade de trabalhar o racismo.
“Eu acho que a cada ano se reinventa esse espaço de luta; o 20 contemporâneo busca abarcar a possibilidade de trabalhar o racismo, porque não é só data de festa; claro que a gente tem que festejar os avanços, entretanto é preciso que haja reflexão”, observa. Arísia Barros destaca que é preciso saber onde foi que o movimento retrocedeu.
“Nós retrocedemos. A política federal quando ela faz a junção de secretarias, quando prega o fim da Seppir (Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial), que foi uma luta árdua, e coloca num pacote dos direitos humanos e mulheres, ela tira o poder dessa secretaria”, avalia.
A militante destaca que não é uma junção por junção; é uma perda de poder. “O 20 de novembro é isso: é uma data de reivindicação, pautado nas possibilidades e perspectivas de avanço para o povo negro”, observa.
Publicitária e coordenadora do Instituto Raízes de África, ela diz que a data também traz os números criminosos sobre o genocídio do povo negro. “A gente não pode simplesmente comemorar; deveria ser todos os meses, todos os dias do ano”.
Segundo ela, o dia 20 de novembro não é só uma data, é um calendário extenso; uma agenda permanente, com possibilidades e é preciso lembrar o ano todo. Sobre a questão da mulher negra, ela ressalta que existe todo um processo que as mulheres brancas não vivem.
Arísia Barros destaca que a mulher negra teve que romper barreiras e ainda hoje rompe. “Quando a gente vê a questão da vulnerabilidade dentro do feminismo, é a mulher negra que sofre essa vulnerabilidade”, pontua.
A professora comenta que a mulher negra é excluída socialmente, mas reconhece alguns avanços sociais. “Tivemos alguns avanços, quando a gente tem colocado o discurso na rua. Hoje em dia, quando se trabalha a questão da mulher, necessariamente tem que se trabalhar a mulher negra; não foi uma coisa gratuita”, exemplifica.
Segundo a militante, as discussões em torno da problemática das negras foi uma imposição do movimento social, que vem despertando a sociedade, para o papel da mulher negra e a necessidade de ressignificar toda uma luta.
Ela analisa que o tema da redação do Exame Nacional de Cursos (Enem) ‘A violência persistente contra a mulher’, foi um avanço, mas o universo ainda é branco.
“Quando se fala nessa violência, ela está voltada estritamente para a mulher que não é negra; agora você imagina que muitas pessoas acharam bem difícil a temática: já pensou se fosse “A violência secular contra a mulher negra ?, muitos não fariam, porque não está no currículo da escola, no dia a dia das pessoas”, pontua.
Arísia Barros destaca que ainda existe essa exclusão de ver o negro como sujeito atuante, principalmente a mulher. Existe uma escala, uma pirâmide: existe o homem branco; a mulher branca; o homem preto e a mulher preta. Na pirâmide, ela é a última; bem mais abaixo”, argumenta.
Segundo a publicitária, existe racismo com o povo preto, mas com a mulher preta é bem pior. “Eu acho que nós, mulheres pretas, vivemos na construção diária do ser mulher no Brasil”, destaca.
Com relação ao retrocesso social que acontece atualmente na sociedade, com destaque para as redes sociais, a militante comenta que a mídia tem um grande papel. “Temos um parlamento muito conservador, evangélico, que tem traduzido os seus valores e a mídia tem comprado esses valores e reproduzido”, explica.
A sociedade por si só é preconceituosa e por isso reage, segundo Arísia Barros. “Quando ela encontra terreno ela se expandiu. O Congresso é preconceituoso, mas reflete o que a sociedade pensa. Tanto reflete que a sociedade hoje acha que o Congresso está certo”, pontua.
A mesma coisa, segundo ela, é a matança geral que existe hoje no país e no Estado. “A história do bandido bom é bandido morto, que só vale para o bandido pobre, é uma coisa muito guardada, muito velada. Quando ela encontrou voz (a sociedade) para falar por ela, aí ela está falando. Isso é muito perigoso, porque se está dando o direito de matar”, avalia.
É perigoso, segundo ela, “porque a gente fala do nazismo, do fascismo, estamos entrando pelo mesmo caminho. Vimos o caso do angolano que foi morto e a sociedade é tão conservadora e voltada para alguns pontos, que isso não reflete”, avalia.
Segundo Arísia Barros, a sociedade brasileira é conservadora, racista, machista, homofóbica e só responde quando o crime se refere a um deles (brancos, hetero). “É preciso refletir porquê estamos nesse caminho. A gente vinha avançando (os movimentos sociais), mas aí, chega um parlamento que diz que a cartilha do Brasil não serve”, destaca.
A professora reflete que o que é pior é que a massa social não ocupa mais as ruas para protestar contra o conservadorismo. “Cadê junho nas ruas? Cadê a massa? Por que estamos tão quietos e essas questões não nos movem mais? Por que nos acomodamos tanto a esse processo? São perguntas que a gente tem que fazer”, avalia.
Arísia avalia ainda que houve uma acomodação dos movimentos sociais com relação a muitas questões importantes. “A gente não vê mais os movimentos na rua; é preciso fazer a crítica construtiva. Há um processo de acomodação”, pontua.
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