quinta-feira, 8 de outubro de 2015

A difícil realidade de quem mora nas ruas

Com os olhos cheios de lágrimas e ameaçando chorar, Maria Teresa de Jesus diz que é bom a imprensa divulgar as dificuldades que os moradores de rua enfrentam e que é bom que as pessoas saibam como eles vivem. Foto: Olívia de Cássia
Olívia de Cássia – Repórter

Sujeitos à violência, sem alimentação adequada, desnutridos, sem uma cama quente para dormir  e passando por situações de perigos que as ruas oferecem, moradores de rua, homens, mulheres e crianças vão perambulando por aí e aumentando as estatísticas da miséria na capital alagoana rica de belezas naturais.   

 Além disso, os moradores de rua são discriminados e rotulados de sujos; nojentos e sem educação. A maioria das pessoas que vive em situação de rua, segundo os pesquisadores, tem um passado marcado pela violência; pelo desamparo e por problemas vivenciados na família.

Nas ruas do Centro de Maceió, principalmente na Praça da Liberdade, próximo ao Quartel da Polícia, é comum durante o dia a gente encontrar grupos de crianças cheirando cola de sapateiro e\ou praticando pequenos furtos.

Eles também costumam ficar em frente à Federação Espírita de Alagoas, onde ganham alguns trocados lavando e tomando conta dos carros que são estacionados no local; outros perambulam pelas ruas pedindo esmolas para matar a fome e o torpor provocado pela cola de sapateiro.

Apesar dos programas sociais do governo, essas pessoas desconhecem as instituições que procuram amenizar as suas dores. Conversei outro dia com uma moradora de rua, tentei falar com outros na ideia de fazer uma reportagem a respeito da vida que levam, mas não consegui.

O Alex, que frequenta a rua onde moro e recebe comida e algum agrado de alguns moradores,  não permitiu que eu o entrevistasse; não quis me contar sua vida. Achou desinteressante e eu respeitei sua vontade.

Outra moradora, Maria Teresa Santos de Jesus, não fez oposição à ideia de que eu falasse sobre e contasse sua vida. Ela perambula no Centro de Maceió e nas imediações da Santa Casa de Misericórdia, ou no Comércio. Já a encontrei algumas vezes. Me disse que dorme em qualquer lugar; algumas vezes em portas de lojas.

Foto: Olívia de Cássia
Maria Teresa Santos de Jesus, moradora de rua há 40 anos

Teresa Santos de Jesus não parece a idade que tem: 55 anos, negra e de corpo sofrido. Me contou que é moradora de rua há 40 anos e disse que saiu de casa porque foi muito espancada pelo irmão.

"Eu morava no Benedito Bentes; meu irmão me espancava e hoje mora lá e não me dá valor”, lamenta.  A mulher me faz um relato breve da sua história e comenta: “Além de apanhar muito do meu irmão, meu padrasto matou minha mãe, de faca. Isso faz tempo, eu era pequena e tinha oito anos, relata Teresa em seu drama”, ressalta.  

Com os olhos cheios de lágrimas e ameaçando chorar, Maria Teresa de Jesus diz que é bom a imprensa divulgar as dificuldades que os moradores de rua enfrentam e que é bom que as pessoas saibam como eles vivem. “É bom conversar; alivia mais os problemas”, avalia.

Maria Teresa não fala muito sobre a violência que estão sujeitos, os moradores de rua, principalmente as meninas e mulheres, sujeitas à violência sexual e ao desrespeito por parte de algumas pessoas insensíveis.  Fala apenas da sua situação.

“Eu sobrevivo catando latinha; vendo a três reais o quilo e visto e como as comidas que as pessoas me dão. Não tenho lugar certo para dormir; durmo em qualquer lugar: na porta das lojas ou em outro canto; às vezes peço às pessoas para tomar um banho e minha vida é assim: preciso de remédio por causa das minhas pernas, tenho problema de circulação”, observa, mostrando as pernas cheias de varizes grosas.

“Isso é germe em minha perna, preciso de medicamento; a senhora nunca vai me encontrar andando em companhia de alguém; prefiro estar só, não é vida para mim andar com aquele pessoal que consome droga, às vezes eles fazem mal à pessoa”, comenta.

Maria Teresa, como tantas outras mulheres e meninos que moram nas ruas, tem as marcas dos maus tratos e das intempéries do tempo no corpo. Ela disse que nunca pediu ajuda do governo e que prefere viver assim, sozinha.

 “Tem três anos que não tenho contato com minha família; tenho uma filha de 12 anos, Manuela, que mora no Benedito Bentes, perto do colégio, com a mulher do meu irmão. Eu não consumo drogas e nem ando com quem consome: é melhor andar sozinha do que mal acompanhada”,  pontua.

Semas possui três serviços para a população de moradores de rua

Entrei  em contato com a assessoria da Secretaria de Assistência Social de Maceió (Semas) para saber dos programas que estão sendo oferecidos para essa camada da população. Segundo os dados do Serviço Especializado em Abordagem Social (Seas), Maceió tem cerca de mil  pessoas em situação de rua.

A maioria delas possui residência fixa, mas encontra na mendicância uma fonte de renda, por isso acabam passando grande parte do dia nas vias públicas. Famílias do interior do Estado que vêm até a capital (principalmente durante as datas, feriados e períodos comemorativos) também fazem parte desta estatística, segundo a assessoria da Secretaria de Assistência Social de Maceió (Semas).

Atualmente existem três serviços que atendem às demandas específicas da população que se encontra em situação de rua no município. São eles: a Casa de Passagem Manoel Coelho Neto (Albergue Municipal), o Centro de Referência Especializado Para a População em Situação de Rua (Centro POP) e o Serviço Especializado em Abordagem Social (Seas).

“Vale ressaltar que, a partir desses equipamentos, os usuários podem ser encaminhados aos demais programas da Semas, a exemplo do Cadastro Único (CadÚnico) para programas sociais. Os encaminhamentos vão depender do diagnóstico social, feito junto com os usuários, pelos profissionais desses serviços”, observa.

Foto: Olívia de Cássia


Segundo informações da instituição, a principal dificuldade encontrada pelos profissionais do Seas, que trabalham diariamente para garantir os direitos deste público, ainda é o fato de algumas pessoas tentarem ajudá-los, por meio de mendicância.

A Semas também disponibiliza um número para que a população contribua com o trabalho realizado pela Secretaria em benefício da população em situação de rua. Por meio do telefone 0800 284 8048, das 8h às 17h, qualquer cidadão pode repassar informações sobre famílias ou pessoas isoladas em situação de vulnerabilidade social nas vias da capital.

Dessa forma, segundo a assessoria, as equipes dos Centros de Referência Especializados em Assistência Social (Creas) e Centros de Referência Especializados em População em Situação de Rua, os Centros Pop, são acionadas a demanda apresentada.

HISTÓRICO

Desde novembro de 2013, a Semas vem trabalhando para garantir um acompanhamento dos serviços socioassistenciais direcionados à população que se encontra em vias públicas. Foram criados o Plano Emergencial e o Grupo de Trabalho Intersetorial Direcionado ao Atendimento à População em situação de Rua, atualmente ativo e contando com a participação de 11 secretarias municipais.

“A Assistência Social não é contra a doação, mas esta doação direta para pessoas que estão nas ruas, dificulta o trabalho de reinserção familiar e de encaminhamentos aos programas socioassistenciais, por parte da Prefeitura de Maceió. Nós orientamos que a melhor forma de doação seja destinada para instituições que desenvolvem trabalhos com população de rua”, enfatizou.


Ainda segundo informações da Secretaria, “o papel da Prefeitura de Maceió é de sensibilização, orientação e encaminhamento das pessoas que estão em situação de rua. Após ser constatado o risco social, a pessoa que se encontra em situação de moradia nas ruas de Maceió conta com a disponibilidade de diferentes serviços. Entre eles, os relacionados ao acolhimento institucional, o retorno para a cidade de origem e a reinserção no meio familiar”, completou. 

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