Professor Nilton Resende acredita que a escrita e a leitura são melhores formas de assimilar mudanças. Foto: Arquivo pessoal
Normas começam a vigorar de fato em 2016 e professor diz que recorre à internet quando tem dúvidas
Olivia de Cássia - Repórter\Tribuna Independente
A partir de 1º de janeiro de 2016 o Novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa estará vigorando oficialmente. Em 2012, o governo brasileiro adiou por mais três anos o início da obrigatoriedade, mas a mudança não agradou a muita gente. Segundo o que foi publicado à época, o acordo objetiva padronizar as regras ortográficas e foi assinado em 1990 com outros países da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP).
O professor universitário de Português e ator de teatro Nilton Resende disse que não gostou. “Eu não assimilei ainda as novas regras; sempre que preciso escrever, vou à internet e procuro saber como ‘devo’ escrever uma palavra atingida pela reforma”, confessa.
O professor ressaltou que não quis e não quer estudar as novas regras. “Com o passar do tempo, creio que, pela pesquisa para quando eu estiver escrevendo e pela leitura de livros escritos sob a nova regra, estarei familiarizado. A melhor dica para saber a língua é lidar com ela: ler, escrever, conversar, usar. Tornar-se íntimo dela”, destaca.
Nilton Resende acha a determinação desnecessária e hipócrita. “Acho que foi bom para que as editoras ganhassem uma enormidade de dinheiro com as reedições. E bom também para a ilusão de que somos iguais, o que é besteira. O belo é falarmos a língua portuguesa, e ela, em cada país, ter características distintas. Que história de unidade da língua? Cada país tem suas especificidades, e o mesmo se dá com a língua”, pontua.
Indagado se as novas determinações ortográficas vão afetar muita coisa no material que já está publicado, o professor Nilton Resende diz que já afetou, “havendo reedições que tiraram dinheiro do bolso dos estudantes e deram dinheiro às editoras e gráficas e distribuidoras”, reforça.
O professor avalia também que a falta de conhecimento dessas regras, apesar de serem poucas as mudanças, prejudicará os candidatos em provas de concursos. “Se no concurso elas forem cobradas, afetará. Para mim, todo certame deveria informar se as questões serão corrigidas de acordo com a reforma. Afinal, enquanto não for obrigatória, creio que temos o direito de escolher entre usar ou não a língua com essas mudanças”, destacou.
Nilton Resende disse ainda que não é a pessoa mais indicada para dizer se as pessoas poderão continuar a escrever das duas formas. Segundo ele, as mudanças estão em qualquer manual de ortografia e quanto às pessoas que fazem concurso correrem o risco de tirarem notas baixas nos exames, ele avalia que isso vai depender do exame em específico.
“Já tivemos outras reformas, e muitas vezes eu vi pessoas mais velhas escrevendo de acordo com as regras anteriores. Isso vai continuar existindo. No mais, fui contra a retirada do trema”, complementou.
Doutorando em Língua Portuguesa e Espanhol diz que não é uma questão de ser contra ou a favor
O também professor Eudes Correia Santos está terminando sua tese de doutorado em Serra Talhada, Pernambuco, e por e-mail diz à reportagem da Tribuna Independente que não é uma questão de ser contra ou a favor, mas sim de se adequar ao que é preconizado pelo Novo Acordo Ortográfico. “O que posso dizer é que tais mudanças podem aproximar a maneira como os falantes de tais países escrevem a língua portuguesa, mas nunca haverá uma unificação do que por natureza não se unifica”, destaca.
Segundo o professor, a forma de internalizar as novas regras é o exercício da escrita. “Não adianta inventar e/ou decorar fórmulas. O que tem quer ser feito é tomar as novas regras, assim como toda e qualquer regra gramatical, como fonte de consulta e, para isso, ter uma boa Gramática Normativa é essencial”, orienta.
O doutorando observa que o que ocorre é que essas mudanças não têm relação com mudanças na língua (portuguesa), mas sim com mudanças na escrita, uma convenção. “A tentativa de ‘unificação’ da escrita de falantes de uma ‘mesma’ língua, como por exemplo, a dos falantes dos países de língua portuguesa, nunca irá ocorrer, tendo em vista a heterogeneidade da língua”, avalia.
Doutorando Eudes Correia: ‘Há tentativa de aproximar linguagens’ (Foto: Arquivo pessoal)
O que irá acontecer, segundo Eudes Santos, “é a adequação do material conforme as novas regras. À medida que as editoras publicam novas edições do material, elas mesmas já vêm ou deveriam vir com as alterações na escrita”, sugere. O doutorando entende também que a falta de conhecimento dessas regras, apesar de serem poucas as mudanças, prejudicará os candidatos a concursos: “Por isso cada estudante tem que pegar uma gramática e tentar internalizar tais regras”, explica.
O professor Eudes Santos reforça que, para se escrever o que é determinado oficialmente, as pessoas têm que estar de acordo com as mudanças: “Foi para isso que as regras foram feitas. A dificuldade, para mim, é a mesma que se tem em estudar as regras antigas. Os estudantes mal têm conhecimento das regras anteriores e ainda terão que entender as novas”, destaca.
Ele avalia que as principais e maiores mudanças no Novo Acordo têm relação como o uso do hífen: “São regras bem especificas que regem o uso deste sinal gráfico e os principais problemas que os alunos e professores vão enfrentar vão além do ensino e da aprendizagem das regras ortográficas. Eles são de natureza maior, voltados para o ensino e a aprendizagem da escrita, falo de uma forma mais ampla, escrever não é, somente, usar bem as normas ortográficas”, argumenta.
O professor entende também que, no caso dos concursos, os editais, em sua maioria, já exigem dos alunos o conhecimento das novas regras e para candidatos a uma vaga pública, “a falta de conhecimento poderá afastar a realização do sonho”, avalia.
Estudante de Jornalismo e assessor diz que não gostou
O estudante de Jornalismo e assessor da Secretaria de Turismo de União dos Palmares (Setur-UP), João Paulo Farias, disse que não gostou do Novo Acordo. “Não gostei, pois como toda novidade a gente demora a se adaptar e quando ele foi implantado em 2009, com a vigência ainda não obrigatória, eu estava concluindo o ensino médio, então eu teria que aprender novas regras”, observa.
João Paulo Farias destacou que indiretamente está por dentro das regras, “pois escrevo quase que diariamente no meu trabalho e faço os trabalhos da faculdade. Uso no meu computador o programa Word 2013, que é uma versão mais atualizada e já vem com as novas regras, mas quando termino o texto, dou uma revisada, pois como a língua portuguesa tem muitas regras, às vezes você deixa simples erros passarem despercebidos”, pontua.
Estudante João Paulo recorre à internet sempre que as dúvidas sobre as mudanças aparecem (Foto: Arquivo pessoal)
O estudante de Jornalismo ressalta que a regra que aprendeu com mais facilidade foi a do trema: “Como também algumas palavras que perderam o acento, como por exemplo, Assembleia. As outras confesso que ainda não me aprofundei, pois são bem complicadas”, avalia.
Questionado se passou por alguma atualização, João Paulo disse que também, assim como o professor Nilton Resende, que recorre à internet quando tem dúvidas, ou ao próprio programa de editoração de texto do computador.
“Não gostei das novas normas, pois você passa anos estudando uma série determinações e da noite para o dia, boa parte destas mudam, fica complicado desaprender tudo. Como a língua portuguesa é muito difícil, vejo que, para quem está começando a estudar agora, será mais fácil aprender as regras”, entende.
ENSINO MÉDIO
O concluinte do ensino médio João Pedro Magnani Correia Harry terminou o ensino médio no final do ano passado e disse que por um lado o novo acordo é bom, por tirar alguns acentos desnecessários e mudar (simplificando algumas palavras) “mas, por outro, é um pouco confuso, principalmente na construção de uma redação, onde o hábito às vezes prevalece”, observa.
Segundo João Pedro, a principal dificuldade que tem é na redação “pois o hábito atrapalha bastante”. A escriturária Maria Elisabeth Guimarães disse que escreve poesias e não gostou da exclusão do trema e da retirada do hífen em algumas palavras. “Tirar o trema de palavras como linguiça, tranquilo e outras não foi uma boa ideia. Já adotei nos meus textos, mas ainda acho muito estranho”, observou.
Conheça algumas mudanças nas regras
Segundo o novo acordo, de modo geral, deixa de se usar hífen em palavras prefixadas. Por exemplo, passa a escrever-se codependente e contraindicação em vez de co-dependente e contra-indicação. Mesmo nos casos em que o segundo elemento da palavra prefixada começa por r ou s deixa de se usar hífen, duplicando-se antes essa letra: antirrevolucionar e não anti-revolucionar, contrassenha e não contra-senha.
No entanto, segundo a regra, continuam a existir alguns casos em que o hífen é usado em palavras deste tipo: quando a palavra prefixada começa por h (anti-herói) e quando a última letra do prefixo é igual à primeira letra da palavra prefixada (mantém-se contra-ataque, por exemplo). Há ainda alguns prefixos que levam sempre hífen: ex- (com sentido de anterioridade) e prefixos com acento gráfico, como pré- e pró-. Em todos os outros casos, as palavras prefixadas não são divididas por hífen.
As locuções, quando o eram, deixam de ser escritas com hífen: fim de semana e não fim-de-semana; cor de vinho e não cor-de-vinho. Passa a ser obrigatório (anteriormente era opcional) repetir o hífen na linha seguinte nos casos em que a translineação se faz onde exista já um hífen: anti-/-incêndio.
FORMAS
As formas monossilábicas de haver deixam ser ligadas por hífen à preposição de: há de e não há-de. O uso do acento circunflexo ou agudo nas vogais e e o passa a depender da forma como essas vogais são lidas em cada país. Visto que a pronúncia de palavras como tônico / tónico é diferente no Brasil e nos restantes países, na prática continua a escrever-se da mesma forma: em Portugal e em Timor continua a escrever-se tónico, no Brasil mantém-se a forma tônico.
Algumas palavras que antes tinham acento gráfico apenas para serem distinguidas de homógrafos (ou seja, de palavras que se escrevem da mesma forma) deixam de ser acentuadas com o AO: assim, escreve-se agora pelo e não pêlo, deixando de se distinguir da contração da preposição por com o artigo definido o. Da mesma forma, passa a escrever-se pela e não péla, para e não pára (imperativo singular do verbo parar).
Segundo as novas regras, os ditongos tónicos na penúltima sílaba deixam de ser marcados com acento gráfico: assim, palavras como jóia e paranóico passam a escrever-se joia e paranoico. No Brasil, esta regra aplica-se também às palavras com ditongo ei tónico, que no Brasil eram até aqui escritas com acento e passam a ser escritas como nos restantes países, ideia e nucleico.
As formas verbais de verbos cujo infinitivo termina em -guar, como desaguar, e em -quar, como adequar, com u acentuado depois de g ou q, deixam de ser marcadas com diacrítico - adeque e não adeqúe para o conjuntivo presente e o imperativo de adequar. No Brasil, também desaparecem os acentos gráficos nas vogais tónicas i e u quando são antecedidas de um ditongo: baiúca passa a escrever-se baiuca, saiinha passa a ser a forma correta da palavra que antes se escrevia saiínha.
Ainda de acordo com a regra anterior, nos casos em que a pronúncia de uma palavra varie quanto à pronúncia de c ou p, ambas as formas são aceitáveis, sendo a consoante escrita opcionalmente ou de acordo com a pronúncia dominante em cada país. Assim, detectar será aceite no Brasil, mas nos restantes países a norma aconselhará detetar. Da mesma forma, deverá poder escrever-se em todos os países caraterística ou característica, refletindo a variação existente na oralidade nos espaços em que o português é falado.
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