Olívia de Cássia - Jornalista
Meu pai era um homem excepcional: temeroso a Deus, justo,
trabalhador e honesto. Era um homem que acordava logo de madrugada para o
trabalho diário e não se furtava às adversidades do tempo. Se ainda estivesse
nesse plano, teria completado 93 aninhos no dia 16 de abril, ele morreu
faltando quatro dias para completar 76
primaveras.
Quando estava em casa, ainda quando tinha saúde, seu
passatempo preferido era ler a Bíblia, notícias dos jornais que eu levava para
ele e ver televisão. A fora isso, as festas de Santa Maria Madalena e ir à
missa eram o seu ritual preferido.
A festa ele não perdia uma noite, nem as novenas, isso
quando ele ainda podia andar. Seu João também gostava de viajar a Maceió para
marcar os bingos que eram feitos, que tinham como premiações carros, para
angariar fundos à construção do Trapichão.
Além disso, gostava de ficar na ponte próxima à Praça
Antenor de Mendonça Uchoa, para saber das novidades da política local. Meu pai
era fanático por política. Era assim que ele ficava sabendo de todo o
burburinho da cidade de União dos Palmares, até o início dos anos 1980, quando
começou a levar quedas na rua e deixou de andar.
Isso herdei dele também, o problema hereditário, a Doença de
Machado Joseph. Herdei dele algumas particularidades, tanto físicas quanto
sentimentais e isso minha mãe Antônia
dizia: “Até o nariz é igual, dizia ela”, mas com o tempo e a maturidade eu fui
pegando as feições da minha mãe e hoje me acho mais parecida com ela
fisicamente do que com seu João.
Eu e minha mãe tínhamos muitas divergências, por conta das
nossas opiniões e dos meus relacionamentos amorosos e amizades que ela tinha
restrições. Sempre acabávamos discutindo de alguma forma, até que por dois anos
ela parou de falar comigo, mas o meu pai, nunca se furtou a me receber e a
conversar com a filha rebelde.
Ele tinha sempre uma palavra amiga e um conselho para me
dar, mesmo quando já estava bem acometido pelo seu problema de saúde. Lembro
daquele sorriso doce me dizendo que eu entendesse a minha mãe, que se trancava
no banheiro quando eu ia de Maceió a União para vê-los e fui proibida de entrar
em casa.
Mesmo assim, meu pai, cambaleante ia até o sofá da sala para
conversar comigo, que ficava sentada no batente da porta, ora chorando, ora
conversando com ele. Ela não baixava a guarda, até que um dia cedeu. Hoje eu
tenho muita saudade dos dois, que já se foram há mais de dez anos, embora as
lembranças estejam bem avivadas em minha mente.
E quando me vejo assim, frágil, sentindo as mesmas
limitações físicas que meu pai teve, até não caminhar mais, me ponho a refletir
sobre muitas questões da vida. Não adianta orgulho, não adianta incompreensões
diante da falta de saúde e das limitações que a vida vai nos impondo.
Aos poucos a gente vai percebendo o quanto somos frágeis e que
é muito tênue a linha da vida. Procuro me aprimorar a cada dia, melhorar minhas
atitudes, comigo e com os outros e fico pedindo a Deus para não dar trabalho a
terceiros e a me conduzir para o bem, me dando mais força e saúde para
continuar a minha missão aqui na terra, que é escrevinhar, isso eu tenho
certeza. Bom dia e fiquem com Deus.
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