Olívia de Cássia – jornalista
Nesta sexta-feira, 21 de abril, é Dia da Paixão de Cristo. Para a nossa família, quando éramos crianças, essa era uma data muito triste, mas em compensação tínhamos como recompensa a toda aquela tristeza, as comidas que a minha mãe fazia nessa época do ano.
Meus pais e meus avós jejuavam na Semana Santa e nos dias normais comiam carne de segunda a quinta-feira, na sexta não podia e voltava a comer no sábado. Era tradição e ainda hoje muitas pessoas católicas ainda seguem esse ritual.
Na Semana Santa, da quarta até a sexta-feira, os nossos almoços lá em casa eram regados a muita comida no coco, peixe, bacalhau, sururu e outras delícias; de sobremesa e para o café mamãe fazia bolos diversos, pés-de-moleques, cocada e tanta coisa gostosa que a gente se fartava.
Os rituais da Igreja eram sempre seguidos pela minha família e na Sexta-feira da Paixão nós acompanhávamos nossos pais na procissão do Senhor Morto, numa tristeza contrita e profunda, depois íamos à igreja beijar o Cristo.
Quando morávamos na Rua da Ponte, seu Antônio Timóteo passava a manhã inteira reproduzindo na vitrola antiga, em disco de vinil, a via crucis da Paixão de Cristo, em volume bem alto e quase toda a rua escutava.
Era a história triste do filho de Deus que veio ao mundo para salvar a humanidade. E, na minha ingenuidade de menina, já me revoltava com a maldade do mundo. Me perguntava como era que aquelas pessoas tinham feito o Cristo sofrer tanto e ele tinha sido tão bom e tão fraterno.
Aquela história era tão triste que sempre me levava às lágrimas e quando fiquei mocinha e fomos morar na Tavares Bastos ia ver a Paixão de Cristo no cinema de seu Armando, mas era filme mudo em preto-e-branco e as cenas eram apenas fotografias estáticas, com legendas.
Também lembro que tinha o filme ‘Marcelino Pão e Vinho’; que eu me lembre foi o único que o meu pai foi e levou toda a família, eu era muito criança, mas lembro que a história era um enredo religioso.
Na Sexta-feira Santa, era dia de ir pedir a bênção aos nossos padrinhos de batismo; no meu caso, padrinho Durval Vieira e madrinha Nenzinha. Ele ia me buscar todo fim de semana para andar de jipe e eu ficava feliz com aquela atitude do meu querido padrinho. Nessa época do ano o ritual se repetia.
Meu padrinho mandava represar o açude da sua fazenda Sete Léguas e eu e Luciana (sobrinha de madrinha Nenzinha) nos metíamos naquela água, para observar de perto a pescaria. Era uma festa para mim tudo aquilo, além das muitas frutas que comíamos no sítio.
Apesar da tristeza da data eu ficava eufórica porque, além das comidas gostosas, sabia que minha mãe não ia nos bater se fizéssemos algum mal feito. Segundo a crença da época, não era dia de bater nem de maltratar ninguém: nem gente nem animal, em respeito ao Cristo morto e crucificado.
Essa regra lá em casa só foi quebrada quando fiquei adolescente e adulta, quando eu já estava de namoro com meu ex-companheiro e minha mãe foi até a Avenida Monsenhor Clóvis à minha procura, com a finalidade de me pegar no flagra e me bater, inconformada com aquele relacionamento. E apanhei muito nesse dia quando cheguei em casa.
São essas as minhas pequenas lembranças da Semana Santa de tantos anos passados.
quarta-feira, 20 de abril de 2011
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