segunda-feira, 16 de maio de 2016

O tempo fechou...

Por Olívia de Cássia


O tempo fechou no Centro de Maceió e vai chover. Parece que um toró daqueles se aproxima da costa; o céu escureceu e o calor é insuportável. Malu aproveita para tirar uma sesta no degrau da escada; os gatos estão dormindo nos degraus acima.

Otto está lá no lugar dele, de gravatinha e tudo, esperando um afago meu, para tirar mais uma selfie. São meus filhotes, meus queridos amores. Me arrisco a adotar outro bebê de quatro patas miniatura que chega hoje, para preencher meus dias incertos.

Sei que vou enfrentar algumas críticas: “Pra que outro animal aí”. Não sei; me apaixonei pelo Juca. Posso não ser uma boa companhia na atual conjuntura. A rabugice da idade e as manias que eu tenho podem não fazer bem a quem quer se aproximar, mas procuro suavizar uma pouco, para não me tornar insuportável.

Não quero ser uma velha cheia de preconceitos, atrasada e caduca; procuro me reciclar, apesar das limitações financeiras e físicas. Pelo menos isso de bom a rebeldia da adolescência me trouxe. Quero tornar meus dias por aqui melhores e mais estimulantes.

Com o afastamento do trabalho, por motivos de saúde, estou procurando focar minha vida em fisioterapia, leituras, caminhadas, mas preciso encontrar um norte, uma ocupação, diversão, para não atrofiar de vez e ocupar meu tempo.

Para quem estava acostumada a sair de casa para trabalhar os três horários, se ver de repente em casa, muda tudo: sua rotina, o tempo e o repensar a vida, de forma que esse repensar também não se torne um fator angustiante. Mas parece que a ficha não caiu de todo para muita coisa na vida ainda.

Tento encontrar respostas para algumas perguntas que surgem no meu interior, mas como elas não vêm, estou procurando me adaptar à nova vida de quase deficiente, acometida de uma doença neurológica, degenerativa e progressiva. Situações imprevistas que podem acontecer com qualquer pessoa; não foi só comigo, eu sei.

Mas ainda tenho tempo de pensar e acreditar que posso lutar para ter melhor qualidade de vida e vou lutar por isso; seja lá o que Deus quiser. Não encontro resposta para minhas indagações; não tenho perspectivas de cura, sei disso, mas os tratamentos paliativos que eu puder fazer, vou enfrentar, até o fim, até quando for possível fazer.

Fiquei muito impressionada na semana passada com uma visita que fiz a umas primas, em União, e as encontrei agressivamente já em estado avançado da ataxia e fiquei me perguntando se nossa família merece passar por tudo isso.

Tentei subir em uma cadeira esta semana, para pegar um objeto em cima da estante e senti minhas forças diminuídas, não posso mais fazer certos esforços físicos; não tenho equilíbrio e minha coordenação motora começa a ficar comprometida.

Não quero chegar àquele estágio final, de dependência absoluta de terceiros, até para fazer a higiene pessoal e outras tarefas íntimas. É tudo muito constrangedor. A ataxia é um transtorno neurológico caracterizado pela falta de coordenação de movimentos musculares voluntários e de equilíbrio.

 É normalmente associada a uma degeneração ou bloqueio de áreas específicas do cérebro e cerebelo, mas no nosso caso não afeta a memória. Ainda bem, que pelo menos isso ainda posso fazer. Pensar, escrever, ler e ver a vida. Por enquanto. É quase noite; boa tarde. 

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