O artista plástico paranaense José Achiles Escobar, nasceu em Cambará, no Paraná, e é um entusiasta da cultura popular alagoana, mas numa conversa franca com a reportagem ele fala de diversos assuntos e avalia que a cultura patriarcal está totalmente falida.
Com ateliê e residência no bairro de Jaraguá, Achiles Escobar reclama da falta de incentivo à cultura popular e quer resgatar uma figura do carnaval, que em Alagoas está esquecida: a Ala Ursa, que sai no boi de carnaval.
“Esse resgate é porque as pessoas estão matando alguns personagens dos autos da cultura popular alagoana, devido a essa questão das mudanças; uma discussão de que tudo é contemporâneo”, destaca.
Segundo ele, o objetivo de fazer esse resgate, é para que não morra essa tradição. “O Ala Ursa nasce no bairro do Reginaldo e é preciso que se coloque mais em evidência, porque ele é um trabalho de marketing; é uma figura mitológica: é o corpo humano com a cabeça animal”, destaca.
Achiles Escobar comenta que numa exposição que viu em São Paulo, da obra de Pablo Picasso, tinha a figura de um minotauro violentando uma mulher. “Então eu vou trabalhar também essa apologia do Ala Ursa e do boi, do ponto de vista da crítica social, da violência dentro da cultura”, argumenta.
Segundo ele, o Ala Ursa também é uma parte poética que não tem mais no boi de carnaval. “E eu estou tentando fazer um resgate plástico; ele tem um visual bonito; a gente pode fazer um personagem para ele representar o período de carnaval em Alagoas”, opina.
O artista plástico avalia que esse personagem do carnaval era para estar na orla; interagindo na prévia do carnaval. “Esse personagem ele está desaparecido, está propício a desaparecer”, reclama.
Achiles Escobar conta que está trabalhando as peças em seu ateliê Tendão d’Aquiles, que este ano completa 25 anos e também serve de escola para alunos de bairros como o Jacintinho, Reginaldo e Jaraguá, que vão até o local aprender as técnicas de sua arte.
A versatilidade desse artista, que adotou alagoas de coração, chama a atenção de quem visita seu local de trabalho. De artista a professor, ele comenta que tem peças que saíram no carnaval do ano passado.
“Esse ano quero colocar dois Ala Ursa, no bloco Jaraguá é o Bicho, que vai fazer dez anos e desfila com os alunos do ateliê”. Segundo ele, o bloco nasceu de uma ideia de que o bairro, para ser um polo cultural tinha que ter uma manifestação. “Dez anos atrás não tinha nada; aí num projeto da Secretaria de Cultura nós criamos o bloco. O alagoano era tão desinformado que ele não sabia o que era um Jaraguá”, ressalta.
‘O bicho veio para entrar no Jaraguá e fazer uma revolução’
Achiles observa que foi fazer a pesquisa e encontrou num CD do Chique Baratinho, que eles têm a figura de um Jaraguá. “Pesquisei na internet e batizei o nome do bloco de Jaraguá é o Bicho. Eu criei um bicho exótico tipo um dragão, que ele vem na transversal do tempo, na contramão da anticultura”, argumenta.
O bicho, segundo o artista plástico, veio para entrar no Jaraguá e fazer uma revolução. “Esse nome é forte; é importante. Na linguagem indígena ele é o senhor dos montes, é o dedo de Deus; a parte mais bonita. Quando ele está na terra, é um jaraguá, quando entra no mar se transforma numa sereia. É a questão de se colocar a lenda de como surgiu o bairro”, descreve.
Achiles Escobar explica que no segundo ano de desfile do bloco foi acompanhado pelo grupo de maracatu Baque Alagoano. Segundo ele, há uma dificuldade muito grande de se aglomerar pessoas para falar de cultura.
O artista plástico reclama que com o decorrer do tempo as coisas foram mudando em Maceió. “Meu ateliê teve que fechar, por conta da mudança do trânsito, a violência desenfreada; a desvalorização da arte, porque hoje em dia não se consegue mais sobreviver de arte; eu ainda sou o último moicano, sou persistente, acredito que a arte é uma alavanca para a transformação, mas isso não pode partir da mente e ficar apenas uma utopia minha, tem que ser uma coisa universalizada, que agrega muitos valores”, reforça.
Achiles Escobar avalia que a arte conta a história de um povo e faz muito bem, mas que a cidade de Maceió está meio perturbada, vivendo um período muito sério na questão da negritude, da consciência negra, da religião de matriz africana.
“Os preconceitos que estão aflorando, esquecendo que existe outra cultura; ela é mais liberta, não é essa cultura repressora, de entrar em questões de valores que a gente já sabe, desde que o Brasil é Brasil e que o mundo é mundo”. Segundo ele, o preconceito é o que impede a arte de existir.
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