POVOADO MUQUÉM
Sobreviventes da cheia do Mundaú recebem barracas e caixas d’água
Olívia de Cássia – jornalista
(Texto e fotos)
A comunidade do Muquém, em União dos Palmares, recebeu no fim de semana 20 barracas, banheiros químicos e 20 caixas d’água, provenientes de recursos do governo federal para ajuda nas ações mais imediatas aos desabrigados da enchente do Rio Mundaú, ocorrida no dia 18 de junho. Treze famílias dessa comunidade, cujas casas caíram ou foram danificadas, estão abrigadas no prédio do posto de saúde do local que ainda está em construção.
Além dessas treze famílias, outros moradores do local estão passando dificuldades. Contam que estão recebendo cestas básicas, mas reclamam que falta a mistura (a carne). Outra reclamação é com relação à distribuição de pessoas nas barracas: duas famílias para cada uma, com um ponto de luz e uma caixa d’água.
O Muquém é uma comunidade quilombola do município cujos moradores ficaram isolados durante a enchente. Os moradores do povoado são quase todos da mesma família, têm como arte a confecção de panelas de barro, bonecos e outras peças de artesanato feitas de argila.
Aproveitando o domingo de sol para lavar roupas e utensílios domésticos, após quinze dias da enchente que destruiu quase tudo no local, eles tentam seguir suas rotinas e contam emocionados como sobreviveram à fúria das águas, em cima de uma jaqueira e de uma mangueira, até que as águas do rio baixassem e pudessem descer com segurança.
Maria Rosimeire, a Meire, conta que ficou na árvore com seus três filhos mais a cadela de estimação chamada Filó, que ficou o tempo todo em suas costas. Ela diz que Filó virou celebridade e já foi fotografada e filmada várias vezes como heroína por jornalistas que foram documentar a tragédia. “Filó chorava o tempo todo e eu falava com ela, dava bolachas, conversava”, disse Meire.
Ela observa que passaram muito frio, muita sede e fome. “Fizemos promessa, teve uma companheira que desmaiou e passamos o tempo todo ali, com medo que a jaqueira caísse pois a correnteza e a força da água eram violentas e a jaqueira balançava”, conta. Meire disse que teve moradora do Muquém que subiu num coqueiro e outra na torre de energia. “A sorte é que a energia estava desligada e ela não morreu de um choque”.
Seu Cícero Nunes tem 70 anos, está operado de uma hérnia, anda com dificuldade e conta como sobreviveu na enchente do Rio Mundaú. “Fui colocado por uma vizinha em cima de uma casa, com muito sacrifício, pois estou operado de hérnia. Ficamos quatro pessoas lá; foi muito difícil”, diz ele.
Quase todas as casas do Muquém foram danificadas ou destruídas pela enchente. A artesã Irinéia Rosa Nunes da Silva, 61 anos, é uma das moradoras do local, também remanescente do Quilombo dos Palmares e foi considerada, em 2005, patrimônio vivo da cultura alagoana.
Ela transforma barro em esculturas de pessoas e animais e durante a enxurrada o ateliê dela ficou debaixo de água; cerca de mil peças de cerâmica foram levadas pelas águas do Mundaú. Com medo de que a tragédia volte a acontecer ela diz que não tem mais vontade de ficar no Muquém. “Não tenho mais vontade de ficar por aqui”, disse dona Irinéia.
Poucos objetos foram salvos das enchentes no povoado quilombolda do Muquém, junto com uma reportagem da Tribuna Independente colocada em um quadro que está exposta em cima de uma mesa, depois de ter sido molhada pela água do Mundaú.
“Perdi quase mil peças que iam para o forno, que foram destruídas pelas águas. Os moradores colocaram os móveis no galpão onde eram feitas as peças pensando que não seriam atingidos, mas perderam tudo. Um morador, três dias depois, encontrou os documentos, o cartão e cerca de 500 reais nos entulhos”, conta dona Irinéia.
RUA DA PONTE
Nos escombros da Rua Demócrito Gracindo (a Rua da Ponte), quinze dias depois da enchente, alguns moradores ainda procuram por algum objeto que possa ser aproveitado. Segundo o secretário de Meio Ambiente do município, Manoel Bernardo, o Maninho, as máquinas pararam de fazer o aterro no restante da rua, “por que os moradores solicitaram para procurar algum fio, tijolo ou telha que possam ser aproveitados”.
No local será impossível construir alguma casa. A Rua da Ponte tinha cerca de 500 casas que desapareceram arrastadas pela força das águas do Rio Mundaú. Até a década de 70, era a rua de acesso à entrada de União e por onde escoava toda a produção.
Na manhã de domingo, um ônibus da empresa Real Alagoas levou várias pessoas para visitarem o que sobrou dos escombros das ruas destruídas. Segundo os moradores do município, está virando ponto turístico de curiosos que vão ver o que sobrou no local.
segunda-feira, 5 de julho de 2010
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