terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

Crianças de rua, parte esquecida da sociedade

Foto: Sandro Lima
Padre Manoel Henrique 

Quando a cidade não acolhe os vulneráveis

Olívia de Cássia – Repórter

Todos os dias, parte do que queremos é ter um mundo menos violento, onde não haja tantas pessoas famintas e desassistidas; pessoas que sejam acolhidas pela sociedade, que parece que esqueceu os vulneráveis. 

O padre Manoel Henrique é professor de Sociologia da Educação em uma faculdade particular de Maceió e reclamou em artigo escrito na página de Opinião da Tribuna Independente sobre esse esquecimento da sociedade, que é crítica em algumas questões, mas ignora os moradores de rua, principalmente as crianças.   

A pesquisa ‘A cidade que não acolhe suas crianças’, orientada pelo padre-professor para os seus alunos, quis saber o motivo de tanta criança de rua estar fora da sala de aula. “O aspecto que me interessava era saber: se ela vive na rua, se ia à escola, se tinha começado e parado e por que não ia para a escola; se não há interesse, ou quais motivos”, destaca.

Segundo o padre Manoel Henrique, moralmente esse aspecto é muito grave: “A elite da sociedade tem medo, condena toda forma de aborto; as mães não podem abortar, as famílias não podem abortar, a igreja também trabalha nesse sentido e até nas eleições esse aspecto foi para o debate, gente que não votou em candidato tal porque era favorável ao aborto, no entanto a sociedade aborta”, critica.

Manoel Henrique pontuou que a sociedade que não dá conta e não responde aos anseios dessas crianças está abortando: “Se não morrerem mais cedo ou mais tarde, abandonadas, ou pela droga, na miséria de todas as formas. Não adianta somente eu brigar para que as famílias não abortem suas crianças, quando eu permito depois que elas nasçam e venham a ser abortadas depois pela cidade e pela sociedade que não cuida delas”, observa.

Por outro lado, segundo o padre, no final da pesquisa, ele quis que os alunos sentissem e vissem alguns aspectos da sociedade e aí, segundo ele, saíram muitas histórias contadas pelas próprias crianças. “É muito bonito estar numa sala de aula, só que olhando para a rua a gente vai observar que muitas crianças nunca foram à escola, e se foram, não era o lugar delas. Eu ainda acredito que muitas escolas não cabem essas crianças, porque não têm o jeito delas”, disse.

“Uma criança de rua, você acha que vai caber em uma sala de aula, quatro horas seguidas, sentada e alguém na frente dela ditando, brigando, às vezes gritando, quando o menino ou a menina tem a liberdade da rua, o jeito de fazer o que bem quer ? Eu acho que não”, avalia. A pesquisa elaborada e discutida em sala de aula questiona também o futuro da cidade. Que futuro vai ter a cidade de Maceió, se grande parte de seus filhos estão fora da escola?, pergunta.   

“Se a gente considera que um país não tem futuro sem a educação, o que posso dizer das crianças que estão fora? Eu nem procurei saber se ali tem escola: a maioria diz que está na rua porque a mãe precisa de dinheiro, a mãe é sozinha, o pai abandonou a família e algumas até chegam a dizer que têm que trabalhar para ajudar o pai em casa. Outra disse que não estuda porque a escola é chata e é tudo sentado e eu não gosto de lugares fechados. É preciso que se tenha outro olhar para essas crianças, outra forma de educar. Escola tem que ter aquele mesmo modelo, com quatro paredes e alguém na frente, nem sempre simpática?”, indaga.

O padre disse ainda que outra criança respondeu que não estuda, mas que já foi à escola, passou pouco tempo, pois precisa trabalhar. Muitas crianças dizendo que precisam sustentar a família também, ajudar o pai e a mãe.

“Teve outra história de uma menina que tinha nove anos, queria ganhar cinco reais para sair com alguém. Ela entrou no primeiro carro, o rapaz não aceitou que ela saísse com ele, deu o dinheiro para ela levar para a mãe, ela dizendo que fazia aquilo porque a mãe obrigava e esse rapaz não saiu com ela, mas viu que outro carro parou e ela saiu com alguém, para ganhar cinco reais”, reclama.

Foram muitas as histórias de vida dessas crianças, quase sempre carregadas de muita tristeza, que o padre Manoel Henrique fez questão de destacar. Segundo o padre, há uma grande contradição na lei que proíbe o trabalho infantil, mas esse mesmo poder não oferece condições para que essas famílias sejam amparadas.

“Antigamente todo mundo ajudava em casa e isso nunca foi crime e nem impediu que as pessoas estudassem e tivessem uma vida respeitada, digna, em família. A lei somente proibindo não resolve”, avalia.

Segundo o padre, em Maceió há uma instituição que cuida de meninas, que passam a semana,  estudam e no final de semana vão para casa, “mas o Ministério Público proibiu o local de ter mais meninas, porque não pode, tem que ter um número X. Isso é um absurdo, hipocrisia de uma sociedade com as suas leis, que proíbem uma criança ter escola só para cumprir o número da lei. Por que não cuida de educá-las?”, indaga.

No entendimento do padre Manoel Henrique, teria que ter um trabalho de secretarias em conjunto: Assistência Social, Educação, Ministério Público: “Teria que cuidar; arrumar um jeito de abordagem para saber onde a criança de rua mora e responsabilizar o pai ou a mãe. Abordar não no sentido de responsabilizar prendendo ou punindo, mas de dar condições a ela;  saber o motivo de essas crianças não estarem cadastradas no Bolsa Família”, pontua.


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