O sociólogo Carlos Martins, que também é professor universitário, disse que é um equívoco dizer que em Maceió não tem carnaval |
Olívia de Cássia - Repórter - Tribuna Independente
De uns anos para cá, Maceió foi vendida para outros estados como cidade para descanso, em época de carnaval; uma festa que nos anos 60 e 70 era de muita animação e folia na capital alagoana, quando havia banho de mar à fantasia, mascarados nas ruas, corso, carnaval de clube e só se tocava frevo, marchinhas e músicas do autêntico período momesco.
O tempo foi passando e outras formas de diversão foram surgindo, mas muitos carnavalescos reclamam que o carnaval de Maceió se reduziu às prévias, período quando saem as ruas do bairro histórico de Jaraguá, vários blocos, que tentam resgar os carnavais antigos. Na avaliação dos estudiosos, brincar Carnaval, ontem e hoje, ainda é deixar-se levar pelas cores, pelo ritmo, pela alegria e vale qualquer coisa para ser feliz.
“Carnaval é vestir-se de forma bizarra, e gaiata; é mascarar-se para surpreender e provocar risos, é dançar e pular no asfalto, acompanhando blocos, trios elétricos, carros de som que dão o tom da animação”.
O sociólogo Carlos Martins, que também é professor universitário, disse que é um equívoco dizer que em Maceió não tem carnaval, porque, segundo ele, não se leva em consideração que o modelo de carnaval da capital alagoana é um modelo construído quase que espontaneamente, sem a indústria do carnaval operando. Na avaliação do professor, em Maceió existe, sim, carnaval.
“Além disso, a característica marcante do carnaval de Maceió são os carnavais de bairros como em Bebedouro; Ponta Grossa; Pitanguinha; Benedito Bentes; Ipioca, que são ações, em muitos lugares, espontâneas”, avalia.
Carlos Martins destaca que o carnaval de Maceió é “diferente dos carnavais midiáticos, depende do ponto de vista de um carnaval modelo, aqui não existe carnaval para turistas, mas para o maceioense existe sim”, observa.
Segundo ele, não é possível resgatar o carnaval de Maceió, porque só se resgata o que se perdeu. O professor avalia que existe um tipo ideal de carnaval construído a partir de alguns modelos no Brasil. O carnaval da Bahia, o carnaval do Rio e o carnaval de Pernambuco: “O que há de comum nesses três modelos? Multidões e mídia nacional, criando assim uma espécie de tipo ideal de carnaval”, observa.
Segundo Carlos Martins, quando se olha para Maceió, não se vê os mesmos elementos que existem nesses carnavais citados, “então ocorre a conclusão de que na capital alagoana não existe carnaval”, destaca.
Carnavalesco avalia que maceioense ficou sem carnaval de 20 anos para cá
O secretário de Cultura de Marechal Deodoro, o carnavalesco Carlito Lima, disse que o carnaval é a maior manifestação cultural do povo brasileiro e que o maceioense ficou sem a festa de uns 20 anos par cá, por falta de apoio dos governantes de cada época. Além disso, ele disse que a ideia dos que fazem turismo de "vender" Maceió como uma cidade de descanso “é estapafúrdia”.
Segundo Carlito Lima, isso nunca foi aceito pela população alagoana. “Escrevi artigos, fui às rádios e jornais e ainda hoje defendo haver carnaval nos dias de carnaval. Os ricos vão à procura de alegria em suas casas de praias em Salvador, no Rio ou no Recife; os pobres pegam as kombis velhas caindo aos pedaços e vão em busca de carnaval na Barra de São Miguel, Marechal; Paripueira”, reclama.
Segundo Carlito Lima, saem mais de 200 mil maceioenses buscando carnaval em outros lugares. “Se cada um gastar R$ 200 durante o carnaval deixa de circular na cidade de Maceió em torno de R$ 40 milhões de reais. O turista vem para Maceió porque é uma belíssima cidade não precisava inventar essa história de Maceió não ter carnaval”, avalia.
No entanto, o secretário de Cultura de Marechal Deodoro reconhece que na periferia o carnaval resiste: “Tanto que a Prefeitura de Maceió organizou nove polos de carnaval nos bairros onde existe tradição carnavalesca”. Carlito Lima ressalta também o ‘desaparecimento’ dos bailes de carnaval de clube no Brasil.
RESGATE
“No Rio de Janeiro há dez anos praticamente só havia as escolas de Samba, mas houve uma preocupação em incentivar blocos de ruas e o carnaval do Rio está ‘bombando’ com os blocos que levam alegria e aproveitam para fazer críticas ao momento atual. Aqui em Maceió tem as prévias, mas prévias de quê, se não existe carnaval?”, pergunta.
Ele argumenta que devia ter carnaval nos dias de carnaval e também robustecer as prévias que são fantásticas. “São a prova de que o alagoano como todo brasileiro sente a necessidade de um desabafo de quatro dias, uma alegria fugaz que se chama carnaval. Não é fazer um carnaval igual aos antigos onde brinquei muito na Rua do Comércio é fazer uma adaptação ao modernismo, o que interessa é a alegria que o pobre e o rico têm direito”, defende.
Carlito diz ainda que tem pena quando observa Maceió abandonada nos dias de carnaval. “Ano passado fui aos restaurantes e estavam vazios; fui aos hotéis, cheios, todos os turistas que perguntei se vieram a Maceió porque não havia carnaval, eles respondiam que nem sabiam desse detalhe. Na Praia do Francês, em Marechal os turistas saem atrás dos blocos, Siri Mole, e até no Bloco do Garçons, na Quarta-feira de Cinzas é cheio de turista”, pontua.
Para fugir da mesmice e da cidade-cemitério, como ele diz, Carlito Lima criou o bloco Nêga Fulô, que sai pela primeira vez este ano. “Estamos fazendo uma experiência, para desfilar no domingo de carnaval às 15h30, saindo dos Sete Coqueros; é um pequeno bloco, entre amigos que não se conformam em ver Maceió uma cidade cemitério”, disse esse.
Professor de história avalia que Carnaval precisa ser regatado
O professor de História Gustavo Pessoa avalia que o carnaval de Maceió precisa ser resgatado. “Acho que existe uma parcela da população que não pode sair da cidade e acaba sendo órfã de outra possibilidade. É refém de uma escolha de mercado. Acho que o poder público precisa estar atento a essas demandas e reconstruir o Carnaval nos bairros em parceria com as comunidades”, opina.
Segundo Gustavo Pessoa, uma cidade é concebida para quem vive nela e não para quem é visita. “Quando erguemos uma casa, atribuímos os sentidos que queremos para ela e não o sentido que os visitantes querem eventualmente atribuir. Maceió não pode ser vista como Hotel; precisa ser vista como casa. A semiótica da cidade precisa ser construída por quem vive nela; isso não significa fechar o diálogo com as possibilidades turísticas”, analisa.
MARCHINHAS E FREVOS
Já a administradora de empresas Zejane Cardoso disse que sente muita saudade dos carnavais passados, principalmente das marchinhas e frevo canção, músicas que eram tocadas amplamente nessa época do ano. Segundo ela, hoje o que se toca não é música de carnaval.
O comerciante Jobson Albuquerque, carnavalesco ‘das antigas’, concorda com a ideia de que deveria haver carnaval nos dias de carnaval e aplaude a ideia de algumas pessoas “que vêm tentando recuperar o tempo perdido”, destaca.
Prefeitura realiza carnaval nos bairros da capital
A Prefeitura de Maceió divulgou o calendário das festas carnavalescas nos bairros da capital. As atrações vão começar no dia 6 de fevereiro e vão até o dia 9. Além de desfiles, haverá shows de diversos tipos musicais como samba, funk e axé.
Seis Regiões Administrativas (R.A) tiveram projetos aprovados pela Fundação Municipal de Ação Cultural (Fmac). Na Região 1, será realizado o Polo Alternativo no bairro de Jaraguá; na R.A. 2 três bairros diferentes receberão apoio para realização dos festejos momescos, são eles: Vergel do Lago, Ponta Grossa e Pontal da Barra.
Na Região 4, o bairro de Fernão Velho foi o contemplado e na R.A. 5 o multicultural Jacintinho foi selecionado como polo para folia. Na parte mais alta da cidade, onde está a R.A. 6, dois polos concentrarão a festa no bairro do Benedito Bentes. Fechando a lista, o litoral norte segue representado pelo bairro de Ipioca, integrante da Região 8.
Segundo a Prefeitura, a realização do carnaval em núcleos espalhados em diversos bairros e realizado pela própria comunidade reafirma a proposta de descentralização das festas adotada pelo órgão. A ideia é fomentar e valorizar o carnaval nos bairros levando oportunidades de acesso à cultura e à diversão para mais perto das pessoas.
Ainda de acordo com a Prefeitura, cada projeto recebe um kit que viabilizará a estruturação do evento, contendo palco, som, luz e banheiros químicos, além da contratação de artistas com cachês que não ultrapassem o valor de R$ 5 mil por núcleo festivo.
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