terça-feira, 26 de março de 2024

Semana Santa



Olívia de Cássia Cerqueira

(Republicado do  Blog,  com algumas modificações)

 

Sexta-feira, 29 de abril, é Dia da Paixão de Cristo. Para a nossa família, quando éramos crianças, essa era uma data muito triste, mas em compensação tínhamos como recompensa a toda aquela tristeza, as comidas que a minha mãe fazia nessa época do ano.


Meus pais e meus avós jejuavam na Semana Santa e de quarta-feira a sexta não comiam carne e voltavam a comer no sábado.

 Era tradição e ainda hoje muitas pessoas católicas ainda seguem esse ritual. Pra falar a verdade, depois que vim morar em Maceió, não sigo esses costumes.


Nessa época, da quarta até a sexta-feira, os nossos almoços lá em casa eram regados a muita comida no coco, peixe, bacalhau, sururu e outras delícias; de sobremesa e para o café mamãe fazia bolos diversos, pés-de-moleque., cocada e tanta coisa gostosa que a gente se fartava.

Os rituais da Igreja eram sempre seguidos pela minha família e na Sexta-feira da Paixão nós acompanhávamos nossos pais na procissão do Senhor Morto, numa tristeza contrita e profunda, depois íamos à igreja beijar o Cristo.

Quando morávamos na Rua da Ponte, seu Antônio Timóteo passava a manhã inteira reproduzindo na vitrola antiga, em disco de vinil, a via crucis da Paixão de Cristo, em volume bem alto e quase toda a rua escutava.

Era a história triste do filho de Deus que veio ao mundo para salvar a humanidade. E, na minha ingenuidade de menina, já me revoltava com a maldade do mundo. Me perguntava como era que aquelas pessoas tinham feito o Cristo sofrer tanto e ele tinha sido tão bom e tão fraterno.

Aquela história era tão triste que sempre me levava às lágrimas e quando fiquei mocinha e fomos morar na Tavares Bastos ia ver a Paixão de Cristo no cinema de seu Armando, mas era filme mudo em preto-e-branco e as cenas eram apenas fotografias estáticas, com legendas.

Também lembro que tinha o filme ‘Marcelino Pão e Vinho’; que eu me lembre foi o único que o meu pai foi e levou toda a família, eu era muito criança, mas lembro que a história era um enredo religioso.

Na Sexta-feira Santa, era dia de ir pedir a bênção aos nossos padrinhos de batismo; no meu caso, padrinho Durval Vieira e madrinha Nenzinha. Ele ia me buscar todo fim de semana para andar de jipe e eu ficava feliz com aquela atitude do meu querido padrinho. Nessa época do ano o ritual se repetia.

Meu padrinho mandava represar o açude da sua fazenda Sete Léguas e eu e Luciana (sobrinha de madrinha Nenzinha) nos metíamos naquela água, para observar de perto a pescaria. Era uma festa para mim tudo aquilo, além das muitas frutas que comíamos no sítio.

Segundo a crença da época, não era dia de bater nem de maltratar ninguém, como se bater fosse a punição indicada em dias comuns, nem gente nem animal (e era e em alguns casos, ainda hoje é assim) em respeito ao Cristo morto e crucificado.

Essa regra lá em casa só foi quebrada quando fiquei adolescente e adulta, quando eu já estava de namoro com meu ex-companheiro e minha mãe foi até a Avenida Monsenhor Clóvis à minha procura, com a finalidade de me pegar no flagra e me bater, inconformada com aquele relacionamento. E apanhei muito nesse dia quando cheguei em casa.

Feliz Páscoa para todos e que o domingo seja um dia de reflexão e não só de comer chocolate. Bom dia.

Nenhum comentário:

Palavras da autora

Olivia de Cássia Cerqueira   Pela primeira vez me arrisco na “ficção”. É este “Antes que seja tarde” o meu quinto livro, que espero não ...