domingo, 28 de março de 2021

Minha mãe Antônia

 Olívia de Cássia Cerqueira

 

Hoje acordei pensando em minha mãe e tinha que falar sobre isso. Dona Antônia, ou Toinha, como ela gostava de ser chamada, era uma mulher destemida e forte e ai daquele que cruzasse o seu caminho tentando lhe enganar ou fazer algo para os filhos. Era uma leoa, uma guerreira.

Talvez esse pensamento tenha vindo, por conta das  séries que estou vendo no computador e pelos livros que leio, forçada a ficar em casa agora por conta da pandemia. E ainda bem que tenho esse conforto; diferente de muitas companheiras trabalhadoras, que não têm a mínima qualidade de vida e por isso sou grata todos os dias quando acordo e quando vou dormir.

Tive muitos conflitos com a minha mãe, que hoje avalio poderiam ter sido evitados, muito mais por mim. Não que eu não gostasse dela e hoje eu a entendo muito mais. Infelizmente agora é muito tarde. Ela não me queria “amarrada” a ninguém e a algo que fossem me atrapalhar os estudos.

Queria que eu trabalhasse e viajasse apenas. Mas viajar e trabalhar faziam parte também dos meus sonhos. Mas eu não queria só isso: queria muito mais.  Queria além da liberdade, ter alguém do meu lado que pensasse como eu, que dividisse minhas angústias, propusesse um mundo diferente, com mais igualdade. Mais justo e mais fraterno.

Infelizmente, o mundo não é um conto de fadas e muito diferente dos sonhos quiméricos da juventude, a gente vai aprendendo a duras penas que cada um tem que ter suas próprias experiências, para se fortalecer e criar sua própria personalidade. E era isso que dona Antônia não me entendia: não queria que eu vivesse aquelas experiências, para não passar pelas dificuldades que ela passou.

Numa das suas sérias enfermidades, quando tive que trancar um período da faculdade para cuidar dela, disse que preferia ter uma filha analfabeta que se dedicasse mais a cuidar dela. E aquilo ficou na minha memória. Quando via novelas e programas ela dizia que felizes eram aquelas pessoas que apareciam na tV, que não tinham motivo para se preocupar com a vida. E eu me perguntava: será que ela estava certa?

São pensamentos que me veem hoje, nessa manhã  chuvosa de Domingo de Ramos, quando na min há infância em União dos Palmares, íamos com meus pais à Igreja rezar, rituais que eu não entendia muito bem e que hoje em dia me estão distantes. Bom dia.

segunda-feira, 22 de março de 2021

Eu gritei

Olívia de Cássia Cerqueira

 

Eu gritei. Gritei muito

Para que todos ouvissem

Ouvissem que não sou

Igual a todo mundo.

Não existem cópias.

Eu queria me fazer entender.

Gritos incontidos, berrantes

Eu queria gritar.

Gritar para todos,

Que eu não sou

Ninguém.

sexta-feira, 12 de março de 2021

A gente pensa que pode tudo

 

Olívia de Cássia Cerqueira

 

Quando somos adolescentes pensamos que podemos tudo. A gente ama e ponto, sem medir consequências e impedimentos. Somos utópicos sem mensurar o que seja o conceito, a definição do que seja, na realidade da vida.

O primeiro amor é quase sempre impossível, platônico e cheio de sofrimento, como naqueles filmes americanos água com açúcar, que a gente assiste, com aflição.

Eu acreditava que com aquele sentimento que eu tinha, que seria capaz de mudar tudo. O egoísmo das pessoas adultas que me cercavam, o interesse financeiro, a avareza, que eu definia, sem nada entender de concreto da vida.  Apenas sonhava acordada.

Aquele moço rebelde e cheio de sonhos era tudo o que me encantava naquele tempo. A poesia se fazia presente, a vontade de viajar, conhecer o mundo, conhecer o desconhecido, o misterioso mundo que eu não conhecia, se fazia presente naquele tempo, com mais convicção.

Queria ser independente, viver a minha vida sem amarras, de forma tranquila, sem impedimentos. Mas eu era muito jovem naquele tempo e embora já sonhasse com um mundo mais justo e melhor, eu não sabia de nada, não entendia muito, apenas questionava, era tudo ao contrário do que eu pensava.

Tive a sorte de ter pessoas próximas que me orientassem, embora não entendesse aqueles pensamentos, mas o  mundo gira, a gente vai amadurecendo, conhecendo a vida, seus impedimentos e justificativas e passa a lutar por propostas mais concretas, mais definidoras, que se amoldam a tua maneira de imaginar o mundo, mesmo que agora seja com os pés no chão. A gente pensa que pode tudo e a vontade de ver dias melhores e uma sociedade mais justa não passa. Somos resistência, a luta não para.

segunda-feira, 1 de março de 2021

8 de março sem ânimo para comemorar

 

Olívia de Cássia Cerqueira

 

Na próxima segunda-feira é o dia 8 de maço, Dia Internacional das Mulher. Em outros tempos estaríamos nas ruas celebrando uma data tão bonita e protestando contra a violência cometida contra o extrato feminino, que aumenta ao longo de décadas.

Uma data que foi institucionalizada depois de muitas lutas, sofrimentos e mortes de mulheres trabalhadoras e que deveria ser comemorada por todos nós que lutamos por liberdade, por uma sociedade mais justa, mais fraterna e por dias melhores.

Já foi dito e comprovado que a violência contra a mulher, crianças e adolescentes, na maioria das vezes, acontece dentro da própria casa, cometida pelos companheiros, familiares e até pelos pais. Ainda hoje tem muito assassino impune pelas ruas ou escondidos em  becos e fazendas de nosso Estado e isso precisa acabar.

A Lei Maria da Penha foi sancionada pelo ex-presidente Lula em 2013 e é uma homenagem justa a essa mulher que deu o nome à lei e que só conseguiu justiça por ter ficado paraplégica depois de um tiro que levou do marido, quando conseguir escrever um livro contando sua própria história.

O ex-marido de Maria da Penha negou que tivesse sido ele o autor do disparo, foi condenado à prisão por dez anos, mas só cumpriu dois deles. Inconformada com a atitude do juiz que deu liberdade a seu agressor, ela começou uma luta incansável que foi terminar no Congresso Nacional e que culminou com a aprovação da lei que tem o seu nome.

No dia 3 de março de 2015 foi aprovado o projeto de lei do Senado que classificou o feminicídio como crime hediondo e o incluiu como homicídio qualificado. O texto modificou o Código Penal para incluir o crime - assassinato de mulher por razões de gênero - entre os tipos de homicídio qualificado.

A aprovação da proposta foi um avanço para os movimentos sociais femininos e segundo o que foi publicado, a matéria estabelece que “existem razões de gênero quando o crime envolver violência doméstica e familiar, ou menosprezo e discriminação contra a condição de mulher”. O projeto foi elaborado pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da Violência contra a Mulher.

Mas infelizmente, nem todas as mulheres têm a comemorar nessa data, pois a violência contra a mulher é um problema que precisa ser enfrentado, denunciando-se e combatendo a cada dia.

Nem a Lei Maria da Penha e nem O texto que modificou o Código Penal, tão pouco as denúncias têm surtido efeito na diminuição da violência cometida contra a mulheres, cotidianamente.

Os atrasos nas políticas públicas e inversão de valores que estamos vendo na política desde 2016, só aumenta o estímulo de trogloditas acharem que corpo de mulher é capitania hereditária.  Não podemos nos calar diante de  todo esse horror, diante do caos.

Semana Santa

Olívia de Cássia Cerqueira (Republicado do  Blog,  com algumas modificações)   Sexta-feira, 29 de abril, é Dia da Paixão de Cristo. ...